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domingo, 27 de setembro de 2009

Desmemórias- capítulo 10

Mais um quarteirão a frente, restavam apenas dois ou três. Passaram em frente ao shopping/cinema, e comentando os cartazes dos filmes novamente discordavam um do outro.

Ao atravessarem a avenida conhecida por ‘casas de entretenimento adulto’ [e nem sempre apenas servidas de mulheres], as piadas foram inevitáveis: ela disse-lhe que ele estaria morrendo de vontade de entrar em alguma ‘casa’ daquelas. Ele respondeu com um cinismo, perguntando se não era por ali que ela trabalhava... Ganhou mais um beliscão, dessa vez no outro braço.

Perto do último quarteirão, faltando cinco minutos pra meia-noite, passaram em frente a uma entrada do metrô. Ele olhou, e disse a ela em um tom um tanto pessimista que quando passassem pela mesma entrada no outro lado, já passaria da meia-noite, portanto talvez não desse tempo dela pegá-lo. “Preocupado com isso?”, perguntou ela, sem ouvir resposta. Ele apontava para um café, do outro lado da avenida, como o ‘ponto final’ para a decisão de ambos. Ela concordou.

O nervosismo e a pressa inexplicável fez ambos queimarem a língua. Meia-noite, um, dois, três, quatro, cinco minutos. Se olharam, e sem se falarem andaram mais poucos metrôs. “Pára”, disse ela.

- Então... É o fim da noite, certo? –perguntou a garota-

- Bom... O fim é. Mas qual fim?

Ela pediu a ele que fechasse os olhos, ele o fez prevendo um beijo.

Ouviu a voz dela um pouco a frente dizendo alto “Pode abrir!” E percebeu que ela caminhava em direção ao metrô, prestes a fechar.

Conformado, porém com uma ponta de decepção ele deu poucos passos até a direção dela, que caminhava de costas, olhando a reação dele. Falou alto, contrariando seu próprio gosto, perguntando “Então é assim?!”. Ao longe, a garota exclamou “Ah, esqueci uma coisa!..”


Caminhou novamente na direção dele, deu-lhe um rápido beijo na bochecha, esfregou a pequena mancha de batom e disse “Você ta me devendo um encontro amanhã à tarde, esqueceu?!”. E virou as costas de uma vez, correndo para a escadaria do metrô.

Desmemórias- capítulo 09

Entraram em uma livraria, não sabendo quem deu a idéia primeiro. Lá eles novamente compararam gostos, nem tão diferentes assim, mas que provocava piadas. Dicionários, CDs e DVDs a parte, riram bastante, ainda sem perder a ironia mútua. Estranharam a movimentação da loja diminuir, e perceberam que estava fechando. “22 horas!”, ouviram de um funcionário da loja, e exclamaram ambos com um leve suspiro “Nossa, mas já?..”. “Fazer o que, voltar outro dia”, disse ele sem notar o ‘planejamento’ do próximo encontro, o que ela também não notou...

Andando mais alguns metros ambos decidiram que era uma boa hora para parar e sentar um pouco. E decidiram juntos, sem comentários irônicos. Em frente a um desses bares com cadeiras na calçada sentaram. Assim que veio o garçom, ele pediu uma cerveja, julgando que ela o acompanharia. Ela pediu um açaí.

Tomou a cerveja sozinho, sob os olhares e comentários de desaprovação dela, que dizia que a essa altura não voltaria com ele nem para implorar uma carona, por causa do álcool... Ele então pediu algo calórico pra comer, e ouviu novamente comentários sobre aquilo. “Ta servida?”, perguntou-a quase colocando o lanche em sua boca...

Conversaram mesmo assim, menos irônicos, ele comentando sobre os tempos de faculdades e noites intermináveis de festas, e ela sobre conciliar estágio, faculdade e festas. Em nenhum momento, estranhamente, comentavam sobre relacionamentos.

Quando ambos estavam satisfeitos, a preguiça parecia bater. Talvez o momento mais arriscado da noite também, o comodismo da situação, uma ponta de sono mais por causa do cansaço acumulado da semana, e a vontade de dormir pela manhã inteira no domingo. Ambos pensavam e disfarçavam imaginando que o outro não perceberia. Até reunirem coragem para seguir a caminhada.

O relógio marcava cerca de quinze minutos pras 23 horas. Mas ambos não saberiam, evitavam olhá-lo, talvez por ansiedade, talvez por temê-lo.

Havia no quarteirão seguinte um belo, ainda que pequeno parque. Aberto até quase meia noite aos finais de semana. “Nem louca eu vou entrar aí! Quer ser assaltado vai sozinho!”, disse ela. “Dureza, pára de se preocupar tanto garota, não estamos aqui? O que tiver que ser, será. Qualquer coisa é só gritar bem forte ok? Acho que você deve conseguir com essa voz...” Assim, convenceu-a, muito relutante e um pouco frustrada por não ditar agora as cartas do jogo.

“Um ninho de mata-atlântica incrustado no meio da mais movimentada avenida da cidade”, definiu o parque à garota, que provavelmente já o conhecia, ao menos de passagem. “É, eu sei. Mas sabia que eu nunca tinha entrado aqui?”, respondeu ela esclarecendo a dúvida. E andaram pelas ruelas calçadas de pedras antigas, como o antigo pavimento das calçadas da avenida. Passaram por árvores, ouviram corujas cantando. Até mesmo o clima ali dentro mudava, e ela sentiu um pequeno desconforto por causa da brisa fria. “É por causa das copas das árvores, que são enormes. Aqui dentro a temperatura abaixa mesmo”, explicou ele, acrescentando para não deixar a cutucada de lado “Quem mandou vir vestida assim né?!”. “Hahah engraçadinho. Vamos andando que assim esquenta...”

Pararam sobre a pequena ponte que ligava as duas extremidades do parque, com uma rua passando por baixo. Encostaram ali e ficaram apenas observando os carros. O tempo, a essa altura, era algo que não existia. Ao menos na cabeça de ambos ele parecia parar.

“É muito estranho esse bando de gente, esse bando de carro, não é?”, “disse ela, sem dirigir-lhe o olhar, direcionando o mesmo para a multidão de faróis, buzinas, freadas e aceleradas.”

Ela havia tocado num ponto em que ele tinha uma opinião mais do que formada, e irredutível, que sempre provocava discussões com quem se atrevesse a lhe falar o contrário.

- Bom, você sabe, eu sou fotógrafo. Apesar de às vezes parecer ridículo trabalhar em festa de casamento ou alguma comemoração de gente rica e metida, eu sempre vou preferir tirar fotos de pessoas do que de paisagens.

- Por quê? –perguntou ela em tom sereno-

- Simples. Porque têm vida. Não há nada como uma boa expressão. Triste ou alegre é um sinal de vida. Claro que eu tiro as minhas fotos de paisagens, e gosto delas, mas é o que eu penso, e disso não vou abrir mão.

- É, até que faz sentido...

Saíram dali, caminharam para a parte sul do parque. Estavam se dando bem, se é que em algum momento da noite as ironias mútuas significavam o contrário.

Mais uns minutos andando e tentando ler as espécies de árvores e plantas com a luz que não era claramente necessária para aquilo, ouviram os apitos do pessoal da segurança do parque, junto com os avisos de que fechariam em dez minutos. Demoraram mais cinco até sair, e demorariam dez se não fossem os constantes apitos que lhes perturbavam, tamanha era a tranqüilidade que sentiam ali dentro.

Pouco antes de saírem, sem parar de andar, ele apontou para um dos bancos dizendo:

- Esse banco aí... Na época da faculdade eu saía do estágio, que era aqui perto, e vinha aqui pro parque estudar. Muitas vezes acabava dormindo aí.

- E nunca te aconteceu nada?! -perguntou ela espantada-

- Que nada. A gente tem o costume de achar que tudo é perigoso. O terror da nossa vida é a gente mesmo quem faz. Por isso ficar dentro de casa é perigoso, a gente se sente seguro e que nada mais se compara àquilo...

- Não quero parecer intrometida... Mas parece que você fala por experiência própria... –disse ela totalmente polida e até temendo uma reação mais intempestiva dele-

- Olha... –pausando a fala- Não vou negar que passei algumas poucas e boas. Mas... Quem não passou né?

Ela percebeu uma leve hesitação dele em falar sobre o assunto, e não quis insistir. O parque fechava os portões às costas deles. 23h45min. Consultaram o relógio, dando a impressão de que faziam isso apenas para saber que era este o horário de fechamento dele, um bom programa noturno pra quem quer apenas espairecer e observar.

Desmemórias- capítulo 08

- E agora, pra onde? –perguntou ele-

- É o seguinte, agora posso te explicar, e se você não aceitar os termos podemos nos despedir agora mesmo... –respondeu a garota demonstrando uma autoconfiança que beirava a arrogância-

- Eu estou de acordo, acho tudo isso muito estranho, mas vamos lá...

- Então. Nós vamos dar algumas voltas na avenida. Quantas voltas e o que a gente vai fazer por aqui só depende da vontade de nós dois. Se até meia-noite nossos gostos não combinarem ou na pior das hipóteses, um de nós não quiser mais ver a cara do outro, viramos as costas e eu pego um metrô pra ir embora. Combinados?

- Meia-noite? Tudo isso?.. –disse ele claramente provocando-a –

- Isso mesmo, topas ou não?

- Garota, você está prestes a passar às quatro horas mais longas da tua vida...

Claramente os dois gostavam de se provocar, desde o princípio, quando foi marcado o encontro duplo ao telefone. Havia uma tensão no ar que só aumentava com as constantes piadas em relação um ao outro, e até aquele momento ambos pareciam não ter uma opinião definida sobre o outro.

Começaram o passeio partindo do meio da avenida até o início. Passaram em frente a alguns barzinhos, botecos com cadeiras na rua, pessoas bebendo e fumando do lado de fora. Ele comentou algo irônico a respeito da lei, dando graças a Deus pela mesma, no que ela retrucou-lhe irritada, dizendo que era absurdo, inconstitucional e outras coisas do tipo. “Você fuma?”, perguntou ele, já prevendo pontuação recorde negativa para ela em caso de afirmação. “Não, mas constitucionalmente eu tenho o direito de fumar aonde eu quiser, se eu quiser!”. Ele riu como se não acreditasse no que havia ouvido. “Você é uma figurinha mesmo garota!”, evitando sempre dizer o nome dela.

Passaram por uma banca ainda aberta, ela entrou sem se importar se ele viria atrás. Comprou uma revista de ciência e outra de palavras-cruzadas. “Pra que isso?”, perguntou ele. “Se ficar muito chato falar com você eu tenho algo pra fazer!”. Ele não ficava mais irritado com as tiradas dela, apenas ria ironicamente de volta. Quem os visse naquele momento não saberia dizer se eram namorados ou ex-namorados acorrentados andando juntos à força...

Passaram em frente a um espaço cultural, já perto do começo da avenida, no Paraíso. Ela disse que deviam ir ali qualquer dia “isto é, se a gente voltar a se ver” pelas suas próprias palavras.

- Pronto, estamos no começo. E agora voltamos pelo outro sentido?

- Isso mesmo garoto, está aprendendo...

Atravessaram a rua. Passaram ambos alguns cinco minutos calados, talvez em pensamentos próprios.

- Sabe de uma coisa interessante? –perguntou ele como se esquecesse quem estava com ele-

- Diga, mudinho. –respondeu lhe fazendo lembrar-se disso...

- Ah, esquece! Tudo pra você é piada não é mesmo? –demonstrando novamente estar contrariado-

- Ahh quanto drama. Estou interessada, diga, sim? –tocando de leve o braço dele, no primeiro sinal gentil daquela noite-

Fazendo uma pequena pausa ele retomou:

- Eu tenho dificuldade de andar aqui.

- Por quê?

- Porque é uma avenida larga, enorme. Eu vivo de tirar fotos né, então eu olho pra todos os cantos. Mas aqui eu tenho que olhar pro lado, pra cima, pro outro lado, tudo ao mesmo tempo. As imagens se misturam, bagunça tudo...

- Os pensamentos também? –respondeu ela-

- Como assim?

- Oras, é como sua câmera. As imagens vêm, passam por uma lente e sai o resultado final, a foto.

- Humm.

- Isso mostra que você não é uma máquina que capta algo e emite um relatório pronto, perfeito na hora. Tem que pensar a respeito do que vê, às vezes pode ver milhões de vezes e ainda assim não conseguir dizer por que gosta ou não gosta daquilo.

- Impressão minha ou você filosofou agora? –desta vez ele que deu a tirada sobre o que ela disse-

- Hahah, sim, talvez. De Filósofo e louco a essa hora todo mundo tem um pouco né? Aliás, que horas são?

- 21h15min.

- Estamos aqui há uns 40 minutos, é isso?

- Basicamente. A não ser que os últimos 38 de patadas e ironias não contem... –disse, fazendo-a rir como até então não havia feito.

Passaram alguns minutos apenas comentando os tipos estranhos que viam, e seus modos de se vestirem. Sábado à noite na maior e mais fervilhante avenida da cidade, e estavam num encontro que não se podia definir o que era, e aonde daria.

Talvez sem notarem, iam engatando pequenas conversas. Ele lhe perguntava sobre o trabalho dela, e ela sobre as fotografias dele. “Já fiz um evento aqui, e ali, e ali...” dizia ele, até ela cortar o que estava falando para apontar alguma coisa e fazer um comentário ácido ou humorado. Ele começava a se acostumar. “Com você do lado eu tenho que falar frases de 140 caracteres...” disse ironicamente a ela, que percebendo o trocadilho riu bastante. “Você vê uma imagem e clica, mudo, observando. A minha forma de observar é falando!”, disse ela, reforçando a diferença. “Ok, mas não precisa apontar né...”

Passaram em frente ao ponto de partida, o estacionamento. Ela apontou para o carro dele e disse “Se quiser fugir ainda dá tempo, hein? Daqui até o fim da avenida você pode ficar em perigo!”. “Perigo...”, gracejou ele. “Com esse tamanho todo?..”. [Apesar dela não ser exatamente baixa, e sim ele alto]. Após isso ela deu-lhe um beliscão que deve ter doído...

Desmemórias- capítulo 07

Nada poderia ser pior...” Ele pensou. O motivo: a chuva torrencial que pegou ele e a amiga do amigo de surpresa.

Estavam se falando praticamente pela primeira vez, quase dois desconhecidos, aproximados por um amigo [da onça] em comum. Para tentar quebrar o gelo da situação inusitada, ele sugeriu a ela, ao telefone, que fizessem no mesmo dia dois programas: um que ele sugerisse e outro que ela assim o fizesse. Como ‘brincadeira’, ambos anotariam mentalmente pontos que gostassem e não gostassem em ambos os encontros. Caso desse certo, sairiam outra vez... Ela gostou dessa estranha sugestão, e talvez por ser mesmo diferente do usual, concordou.

Ele escolheu o dia, e ela a noite. Ele então a levou para uma escalada em um dos picos nas redondezas da cidade. Em seu próprio carro, que a contragosto resolveu comprar e estava pagando a duras penas...

Mas a surpresa foi que no meio do caminho o céu nublado que ele de forma otimista dizia que iria abrir, na verdade despencou. Teve que encostar o carro, e esperar. Não sabia o que dizer, a não ser reclamar da chuva e xingar, ainda que se contendo na frente dela. E ela ria...

Isso não o agradava, nada o agradava, mas ao pensar que não havia o que fazer, e que devia ser mais gentil com ela, se conformou... Ela sugeriu o rádio, e ficaram alguns minutos discutindo um o gosto do outro, em meio a risos. Até ela desligar o som, aparentemente só para provocá-lo. Ele não se importou, e perguntou a ela “E agora? Com essa chuva vamos ter que voltar, já era a nossa escalada!..”

Ela concordou, já que a chuva parecia diminuir, ao menos o granizo acabara. Ele perguntou se devia deixá-la em casa, ela disse que sim, mas sem o deixar esquecer que a noite fariam o que ela havia programado.

Ele pensava que a garota era dura na queda, não dava o braço a torcer em nada –assim como ele- e tinha uma personalidade marcante. E ao mesmo tempo parecia insistir em provocá-lo, o que ele não sabia ser apenas por diversão ou para ganhar sua atenção. Por causa dessa intriga esboçou um sorriso mínimo, imaginando o que viria noite adentro.

Deixou-a na portaria do prédio, ouvindo dela mais um lembrete de não se esquecer de pegá-la às 20hs, com um leve tom de ironia na palavra ‘esquecer’...

Então ele assim o fez. Pontualmente, algo que ele mesmo não gostava, se prender aos ponteiros do relógio, se prender a horários de outras pessoas... A noite era quente, mas mesmo assim ele se arrumou considerando que ela escolheria uma balada qualquer, com calça jeans e camiseta, formal como sempre. Interfonou, ela avisou que estava descendo e em poucos minutos estava em frente do carro dele, de shorts, camiseta e tênis... “Você vai assim?!” Perguntou, sem conseguir disfarçar o espanto. “Você não sabe aonde vamos!..” Respondeu ela sem deixar a ironia de lado. “Ta bom então”. Um pouco contrariado ele sequer abriu a porta pra ela, que o fez sozinha, ligou o carro e saiu. “Pra onde vamos?”, perguntou novamente. “Pra avenida.”, respondeu ela, indicando a avenida mais movimentada da cidade e fazendo-o virar o pescoço com estranheza novamente. Chegaram ao local, ela sugeriu que ele parasse em algum estacionamento 24hs, e ele o fez, quase ao meio da avenida de mais de um quilômetro de extensão.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Desmemórias- capítulo antepenúltimo

Ele voltou da praia, e para sua surpresa, ela mesma foi quem tomou a iniciativa de procurá-lo. E terminarem por ali. Ela deu a desculpa de que a faculdade estava difícil e teria que se concentrar nos estudos, e ele não se esforçou para pensar se seria verdade ou não. Respirariam ambos.
E nos dias e semanas seguintes foram, lentamente, buscando coisas um do outro em seus apartamentos. E para ambos, a impressão de que quando algo assim acaba tudo se torna insignificante a ponto de trazer lembranças tolas. E são essas as que mais machucam por sua falta.
Mais alguns dias, semanas, meses se passam. Ele sentia um vazio que o tornava um robô. Ela, pelo que ele soube de algum amigo em comum, estava namorando. Ficou contente. Ainda achava que era o que ela merecia, se julgava jamais poder se confiar a alguém de novo. Mas quando esses pensamentos solitários batiam, lembrava do dia no cemitério, e do céu cinza, e pensava consigo mesmo que precisaria, de qualquer jeito, encontrar algo que lhe fizesse sorrir. Não sorrir o tempo todo como a fase juvenil lhe proporcionava, mas algo que lhe desse prazer além do período em que estava com a câmera na mão, captando não só momentos, como sentimentos do que via. Precisava se sentir vivo, e foi se aventurar a clicar esportes radicais. Nesse meio tempo continuava os trabalhos casuais, e foi na cobertura de uma festa [o que ele mais detestava] que encontrou alguns amigos da época do cursinho.
Houve alguns abraços. Perguntas de um lado e de outro, quando a resposta “Na verdade to trabalhando aqui hoje” surpreendeu a todos. Não poderiam reeditar as conversas e baladas de anos atrás. Mas trocaram telefones. Nem ao menos chegaram a perguntar a ele sobre a antiga namorada. E nem poderiam, não caberia para o momento, um ano e pouco depois.
Fato é que ele, procurando ser o oposto do que vinha sendo, ligou para o amigo, num sábado pela manhã. Acordou-o e se desculpou, ouvindo do outro como fora a noite anterior, e como ele fez falta no recinto. “Eu fiz falta? Explica isso!”, perguntou, quando ouviu do outro a resposta: a amiga da sua acompanhante estava sozinha, havia levado um fora do ficante e só soube disso ao notar que ele não iria aparecer... E quem salvou a noite foi o amigo de cursinho, falando dele, um fotógrafo, cara simpático, meio fechadão, mas boa pinta. A garota, ainda num leve desânimo, concordou... Se o próprio não achasse aquilo patético demais...

Desmemórias- capítulo 06

Apenas algumas horas após retornar da praia ele não queria ficar só, muito menos no apartamento vazio. Apenas deixou a mochila, e devolveu o carro.
Da casa do amigo andou uns vinte minutos a pé. A princípio sem rumo definido, mas seus passos o levavam automaticamente até lá. O cinema no centro, onde tantas vezes eles foram juntos, as vezes matando aulas do cursinho.
Olhou o movimento e finalmente se decidiu a apenas sentar-se numa mesinha do café. Pediu um. Ali não haviam bebidas pra batizá-lo. Conformou-se com o café quase amargo. Ela gostava doce. Ele queria parar de pensar, mas, se o fizesse, não seria desrespeito?..
Ficou ali um bom tempo. Passadas umas dezenas de minutos até conseguia esboçar um sorriso, com o sol do inverno lhe fazendo tirar o cachecol, que ela ensinou-o a gostar. Mais alguns minutos e ouvia os comentários cruzados das pessoas que saíam de uma sessão recém-terminada. Alguns falavam em “destino”, outros em como o filme foi previsível, algumas jovens se encantavam com a história. Nada que ele não conhecesse, já havia passado por todos esses tipos de comentários quando saíam juntos de lá.
E lembrou, ainda que se esforçando para ser a última que dedicaria a ela pelo menos naquele momento, de uma das últimas conversas antes da separação forçada por causa da faculdade:

- Você vai... Diz que vamos nos ver, nos falar, mas chegando lá é outro mundo!
- Há quantos anos estamos juntos? –perguntou ela-
- Você sabe bem!
- Então você não acha que isso é o bastante pra confiarmos um no outro?
- A gente diz isso agora. Facul é só balada, é gente nova, e a gente ta brigando há uma semana por causa disso. Não dá, não dá pra ser assim desculpa!


Ele sentenciou o fim. Ele não deixou resposta para ela. Ele mesmo imaginou a vida de ambos juntos de mil maneiras diferentes... E não chegou a dizer isso. Deixou acabar, consumido pela amargura. E agora, era só arrependimento. Por mais que quisesse buscar coisas ruins dela para lembrar, não conseguia: apenas lembrava de seus erros. E assim levou os próximos meses...

sábado, 21 de junho de 2008

Desmemórias- capítulo último

A dúvida em sua cabeça era se ele seguiria lembrando desses momentos, um turbilhão deles, pelo resto de sua vida. Queria colocar o ponto final, porém se sentia perdido para isso. Chegara a um ponto chave: ou avançava ou ficaria -eternamente- parado.

Da janela cinzenta do apartamento o olhar se perdia em algum ponto qualquer. Lembrava de quando o namoro se tornou ‘oficial’.


Com um casal de amigos, desciam os quatro para a praia, o apartamento dos pais de um deles a muito custo e promessas de bom comportamento fora liberada. Então, apesar do clima de festa dentro do carro ele o guiava com a seriedade de um motorista profissional.

Chegaram ao final da tarde de uma sexta-feira, ainda aproveitando a hora boa do sol. Mal deixaram as coisas no apê e já seguiram eufóricos para a orla.

O outro casal, já devidamente assumido e notavelmente mais ‘entrosado’ dava a eles a sugestão que ambos tinham em mente, e parecia que o momento se aproximava cada vez mais.

Achado o lugar ideal na areia, ele não pôde deixar de notar o interesse do salva-vidas em final de turno na sua... ficante. Eles eram isso, ainda recém-saídos do colégio, nada assumido. Encheu-se de coragem e juntou-se às duas garotas, que passeavam pela areia, recusando com muito custo as investidas masculinas. Ao alcançá-las, pediu a amiga para falar com ela ‘a sós’, e cobrou-lhe:


- O que você tava falando com aquele salva-vidas bombadão?

- Eu não tava falando, ele é que veio com conversa... Mas por que a pergunta?

- Nada... Acho que tenho o direito de saber ?

- Ah tem?.. Interessante você... [com um leve tom de ironia]

E pegando na mão dela continuou:

- Ta na hora ?

- Na hora?.. É, acho que sim - e ela respondeu-lhe olhando nos olhos-.

- Vamos namorar de vez e chega de enrolação!

Em resposta, ela não concordou, não negou, não insinuou nada, como de costume. Apenas lhe disse:

- Eu falei pro bombadão que eu tinha namorado e que não ia demorar pra ele vir atrás de mim...


E de nem tão longe assim a amiga correu e rapidamente chegou para abraçar os dois e jogá-los na areia. “Agora vão tomar um banho de mar juntos, namoradinhos!” acrescentou.


O resto do final de semana, ainda que desnecessário dizer, mas ele lembrava de cada detalhe, fora mágico.




/===/


Com o carro emprestado [daquele mesmo amigo paciente], ele chegara a um cemitério. Caminhando passos que pareciam demorar anos chegou ao túmulo dela. Parou, em pé, imóvel e ali ficou por alguns trinta segundos. Olhou a mão tremer ao tirar do bolso da calça um papel com algumas frases escritas numa letra de mão bagunçada e tão itálica que só poderia ter sido escrita deitado.

Olhou o papel e olhou o túmulo. Amassou-o e devolveu ao bolso, e com uma altivez e paciência impressionante começou a falar, pausando e olhando em volta vez ou outra, mas seguindo:


- A gente discutia o ‘pra sempre’ e o ‘amor eterno’. Tivemos umas boas até... Eu não concordava com você que tudo era pra sempre e você desgostava do meu pessimismo - ou realismo.

Você se foi sem estarmos juntos e já passei alguns anos me perguntando, me remoendo, tentando acreditar que seria possível fazer diferente. Hoje eu acredito... Ou melhor, quero acreditar que tinha que ser assim, mesmo sem jamais entender por que e ainda ficar mais pessimista sem esse alguém pra discutir o que nunca terá uma verdade definitiva.

- Espero que o que você sentia naquela hora tenha mudado. Ficamos juntos por quase três anos, acho que ao colocar na balança também pra você o lado positivo vai ser maior.

E eu digo isso agora porque sei que você jamais deixaria de se interessar ou se preocupar comigo: eu ainda estou aqui. Levanto, caio, levanto, caio e levanto. Acho que precisava conversar com você, ou com alguém mais, ou até comigo mesmo. Não tenho feito isso ultimamente, se você notou... Por isso vou começar sendo sincero comigo mesmo.

- Se você já está curada aí... Se aquilo que você tentava me fazer entender está aí, então vem me dizer que você ta bem... Vem me dizer que ainda vale a pena estar aqui...

Eu dava aquele riso irônico ao ouvir você falar de ‘destino’. Não sei se estou perto de entender agora, mas acho que eu avaliei pelo lado errado: não se pode pensar que está tudo definido, que estamos aqui com nossa vida toda traçada. Se eu ainda to no meu juízo perfeito significa que cabe a mim escolher meu rumo e seguir da melhor maneira possível. É o que pretendo fazer daqui em diante. Se eu disser que vou te deixar de lado estarei mentindo feio, não vou. Mas pra merecer isso que você dizia existir ‘depois que a gente morre’ eu vou tentar andar com as minhas próprias pernas.

Mas por favor, não deixa eu me perder...

Agachou para olhar a lápide. Tirou do bolso o papel amassado e tentou fazê-lo voltar à forma original. Deixou assim mesmo ao lado das flores que deixou no túmulo.

Levantou-se, calado e assim seguiu. Apenas olhou tudo, uma despedida talvez, um até breve.




/===/


Desceu novamente à praia. Se prometia ser a última vez que deixava tais lembranças o guiarem. Lá chegando parou o carro perto da praia, vazia no inverno e com ressaca.

Sentou numa pequena duna que ia se suavizando até se juntar à areia da praia, de calça e blusa e ficou ali, olhando o céu cinza, lembrando das ‘lições de moral’ dela, das palavras bonitas, do sorriso.


“Pra você encontrar algo bonito mesmo que seja no caos é só fechar os olhos, pensar em algo que goste e abrir de novo pensando nisso.”


“É só querer ver que sempre tem algo além do que a gente enxerga.”


“Sempre ainda terá algo por fazer ou alguém pra encontrar, não importa o que aconteça.”


E pensando nisso tudo, olhando a linha do horizonte ele procurava pelo céu azul e o sol, que não muito distante, sobre o mar, estava brilhando.


FIM








Para D.

Porque esteja onde estiver eu sei que você sempre vai me empurrar pra frente...

sábado, 3 de maio de 2008

Desmemórias- capítulo penúltimo

O relacionamento já não era o mesmo. Após um ano com ambos fazendo cursinho, se vendo diariamente, as discussões iam aparecendo –mesmo para um casal equilibrado e que se dava bem.
O fim do ano se aproximava, e era hora das incertezas de ambos darem lugar a definições. Ela já escolhera seu caminho: iria para o interior. E sabia que para isso teria que dar um tempo –tanto nas brigas quanto no próprio relacionamento- porque durante alguns meses não poderiam se ver. Pensava ela talvez ser melhor assim, se o relacionamento fosse forte o bastante esse tempo apaziguaria as diferenças.
Pensava ela.

Então quando contou a ele a reação não foi a esperada; Ele argumentou, disse que ela era precipitada, que não daria certo, por fim perguntou da relação...
E ela lhe sentenciou com um ‘dar um tempo’.
A ele coube deixá-la falando sozinha, pediu pra o esquecer, a raiva e a mágoa o dominavam. Ela pensou em ir atrás, mas o deixou. Naquela noite não voltaram juntos, ele arrumou uma desculpa.

Passaram poucos meses e ambos entraram na faculdade. Ele em São Paulo, ela iria de fato embora. Mal se falavam, apenas buscavam os amigos para se evitarem, mas ela quis, na véspera, falar com ele. Apenas lhe desejou boa viagem com um tom de indiferença. Ela sentiu por isso, mas seus objetivos eram claros, e ainda acreditava que a mágoa dele passaria com o tempo.
No dia seguinte, já com algumas roupas e pequenas mobílias para o apartamento alugado, ela seguiu para a viagem de algumas boas horas com uma amiga de colégio, que moraria e estudaria com ela. Após uma parada pra abastecer e esticar as pernas, lá pelo meio do caminho, elas tomam um café e conversam sobre o que deixaram para trás.
Ao ter que consolar a tristeza da amiga por sair da asa dos pais, bateu nela mesma uma certa tristeza que tinha nome, passado e –como um dia imaginou- futuro. Quis tentar diminuir a apatia da amiga contando das suas perdas, enxugaram as pequenas lágrimas, se recompuseram e tocaram em frente.
Perto de chegarem ao destino, exaurindo o toca cds com suas várias músicas prediletas, caia a noite e elas entravam numa perigosa estrada de mão-dupla, e a neblina completava os fatores de risco.
A amiga, em tom fúnebre, dizia que tinha algo importante para contar e que tinha que ser naquela hora. Ela olhou para a passageira e lhe disse para continuar. “Fiquei com ele”, sentenciou baixando a cabeça.
“Quê?!”, com uma freada brusca e levando o carro para o acostamento ela respondeu.
“Foi uma semana depois que vocês terminaram, numa balada... Ele bebeu, eu bebi... Desculpa amiga.”
Ela engoliu a raiva e mentalizou para descontar nele. “Esquece!”, nervosa e reticente ela botou fim à conversa e seguiu acelerando.
A amiga pedia para ela reduzir quando seu celular piscou, e então pediu a passageira para olhar a mensagem que chegava. “É dele”, disse. “Lê pra mim”, respondeu.

“Preciso te contar algo, fiz besteira... Sei que você não quer conversa mas me liga, beijos.”

E então tudo ao seu redor estava em câmera lenta. Não ouvia a amiga pedir para diminuir, não via a estrada nem os carros. Pensava em um milhão de coisas, se culpava, o culpava...
Não havia tempo nem era o lugar para tantos pensamentos. Jogou sem perceber o que fazia a direção do carro para o sentido oposto. Sua amiga gritava e a ela aquilo lhe parecia um pesadelo do qual não se consegue acordar. A amiga tirou o próprio cinto por reflexo e colocou o próprio pé no pedal do freio. Um carro no sentido contrário conseguiu jogar para o pequeno acostamento. Elas não.

O carro triscou no outro e capotou. A amiga imediatamente fôra arremessada do carro. Ela deitada no asfalto, com o celular na mão, só pôde ver uma última noite estrelada, e cerrou os olhos.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Desmemórias- capítulo 05

Um pequeno grupo, não mais que 5 pessoas [entre homens e mulheres] caminhavam na rua movimentada no começo da noite, por volta das 19 horas. Entre risadas e goles de bebida que os apressados compraram antes mesmo de chegar ao barzinho, o programa daquela noite, um casal se destacava. Não apenas por ser o único casal, mas de certa forma cativavam aos outros. Estavam todos animados, ansiosos por uma noite que de certa forma era até simples: apenas uma reunião num videokê, com direito a tomar todas sem se preocupar pois ninguém teria que dirigir [mas teriam sim que poder andar para voltarem todos acordados até o destino de cada um].
Inexplicavelmente conseguiam fazer piada de tudo, das luzes da cidade efervescente, da cor do céu, da falta de anúncios publicitários. As risadas até então eram o som da noite.

Som esse que mudou no barzinho: pegaram uma mesa, continuaram a beber, e conversar, e rirem. Um ou outro se aventurou a cantar, e evidentemente, arrancava risos de seus companheiros.
O casal não destoava dos outros, pelo contrário, pareciam ser o motivo pelo qual o grupo estava lá, ainda que sem estar completo, o que de fato era difícil.
Os dois conversavam, riam juntos e curtiam juntos a noite. Arriscaram também um dueto e para surpresa de todos se saíram bem, arrancando aplausos.
Adentrando a madrugada, todos já devidamente quase-alcoolizados, as risadas eram mais freqüentes e mais fáceis. O grupo já dispersava com mais facilidade, um ia tentar a sorte com a garota de outra mesa, outro quase se perpetuava no microfone. O casal já mais leve, decidiu levantar, procurar um canto mais tranqüilo, o que era natural.
Mais uma meia hora depois e eles retornam. Não fizeram nada indevido, pois o lugar era pequeno e movimentado, mas conseguiram um pouco mais de atenção apenas para si próprios.
Todos já começavam a concordar que o caminho de volta era longo e seria a hora de irem, mesmo porque ainda sobrariam algumas garrafas para abastecer o viagem...

O casal andava, como todos os outros, um pouco cambaleante. Todos riam, numa freqüência ainda maior do que no começo e do meio da noite. As piadas e estórias mais interessantes e cômicas eram contadas agora. Estava lá um grupo sem medo de enfrentar as ruas vazias, a desconfiança alheia e os julgamentos de quem os via. As caminhadas de ida e volta eram apenas um pretexto para todos se encontrarem, algo que semanalmente já era muito difícil.
Discutiam teorias e desfilavam soluções. O casal falava, discordavam de si para depois concordarem em tudo.
Estava, naquele pequeno grupo, tudo de bom que se podia imaginar de relacionamento entre as pessoas.

E ele, sentado na prancha pensando em tudo e ao mesmo tempo em nada, deixava o olhar no horizonte. Por que no dia seguinte à briga ele lembrara de coisas do passado, cinco anos antes?
Se convenceu de que pensou demais o dia todo, e ainda tinha a noite que se aproximava, e o domingo de manhã para resolver o que fazer.
Saiu do mar carregando num braço a prancha, fincou-a na areia e se secou. Olhou o celular apenas para averiguar mensagens recebidas ou ligações perdidas. Nada, ele sabia que não haveria nada.
Olhando a data percebeu que seu aniversário se aproximava. Já passava dos 25, e com todas as pressões do mundo para que ele fosse um 'adulto normal, casado e com filhos, consumidor e consumista' [e extremamente infeliz], considerou o dia um tanto melhor.
Resolveu dar de ombros e seguir suas próprias opiniões, e a única idéia que tinha na cabeça naquele momento era de seguir como estava. Em time que se ganha, não se mexe.

sábado, 8 de março de 2008

Desmemórias- capítulo ??

Ele, um formando do 3º colegial. Ela, uma garota do 2º ano.
Um festival cultural, ou algo do gênero. Barracas montadas por todos os lados, cada qual com seu tema. Mas a que mais chamava atenção era um 'experimento científico', uma piscina que contava com a devida caracterização e algumas parafernálias para simular as ondas de um oceano. Não só o maior chamariz como também o que mais impressionava, exatamente por destoar de todas as outras.
Ele um dos responsáveis pela caracterização, e no horário de descanso de um ou outro também cuidava do experimento, que era o principal objeto [pelo menos para os estudantes que buscavam nota pela participação].
As pessoas passavam, naturalmente curiosas, perguntavam, ele com muita paciência sempre respondia tentando não parecer automático. Mas não podia deixar de notar, numa barraca logo à frente, ela, a estudante do 2º ano que já há algum tempo lhe chamava a atenção.
Ele, um tímido estudante do 3º ano, nada 'famoso' por sua popularidade no colégio. Na sua cabeça visualizava uma bela praia de água bem azul, num entardecer já quase noite, com ela ali por perto, querendo estar com ele. Tudo isso enquanto repetia várias vezes o que significava tal engenhoca, e ao mesmo tempo não perdendo de vista a garota do estande à frente, que, acreditava ele de longe, se tratava de algo relacionado a Culinária.
Ele, que nos poucos momentos de descanso procurava por ela, julgava que a garota sequer o notava ali, tanto pela correria do evento quanto pelo simples fato de ele mesmo não chamar tanta atenção...
Era quase meio-dia. Perto da hora do almoço e do tempinho para o descanso, antes de retomar para o resto da tarde. Finalmente podia revezar com outros alunos [que, ao contrário dele, não se importavam em chegar mais tarde]. Foi tomar uma água, passear pelos estandes. Mas o que queria mesmo era chegar mais perto dela.
Chegando no estande ele pôde notar que era uma oficina de culinária, de doces e salgados simples. Ensinavam a fazer e também cobravam pelos mesmos e ele logo pôde vê-la literalmente com a mão na massa. Nunca haviam se falado, ele apenas a observava de longe.
Então lhe perguntou se era fácil fazer aquilo tudo, se ele podia aprender, ao passo que ela lhe respondeu sorrindo, mas naturalmente simpática como sempre fôra com todos.
Parou ali mesmo para fazer um lanche e perguntou a ela quando faria uma pausa. 'Já já to saindo, 5 minutos', disse ela, quando ele tomou talvez a mais ousada atitude de toda sua curta vida: lhe perguntou se gostaria de ir à sala de descanso [também uma parte do projeto, um ambiente com puffs e música suave para as pessoas relaxarem].

Foram então, caminhando a passos ligeiramente tranqüilos para quem acabava de sair de uma 'confusão'. Ele, talvez pela situação inédita de mais liberdade em relação ao dia-dia do colégio, perguntava coisas a ela como se soubesse o que fazer para atrair a atenção dela. E ela, não a 'mais conhecida' do colégio, se é que havia isso, mas conhecida sim por ser simpática e fácil de lidar com pessoas, desde que não fossem egoístas.
Então, para aproveitar da ousadia, já perto da sala de descanso, lhe perguntou se já o havia notado no colégio, já que estudavam ambos há vários anos lá.
A resposta dela, que saiu rápido de sua boca lhe causou o efeito contrário: ficou sem ação, sem perceber por quanto tempo. 'Mas claro! 10 anos estudando aqui, dá pra conhecer quase todo mundo. Sempre te vejo com os caras do 3º ano'

Aquilo lhe martelou na cabeça e tornou suas falas monossilábicas mesmo quando já estavam sentados nos puffs, folheando revistas e observando o movimento, cumprimentando um ou outro amigo que passava por lá. Se perguntava se ela quis dizer que o notava no geral ou se havia mesmo um interesse particular nele. Mal se dava conta de que a conversa continuava e ele lhe respondia poucas palavras, como se estivesse num transe.

De repente se viu abraçado com ela. A 'brincadeira' havia começado por sugestão de uma amiga dela, que junto com alguns outros por ali faziam uma rodinha. Ela falava com o rosto bem perto ao dele, que sentia o perfume dos cabelos e mal ligava para o que ela dizia.
Então as palavras foram ficando mais próximas. A boca dela mais perto do rosto dele. Na bochecha, depois no canto da boca. Logo ele se virou, colocou gentilmente a mão em suas costas... E estavam num beijo que, ao menos para ele, parou tudo ao redor e o fez sentir, de novo, naquela praia.

Ele acordou. Não era o garoto de dezessete anos. Mais precisamente, quase dez anos havia passado. Sabia que fôra um sonho, mas não era isso que o inquietava. Era parte sonho, parte lembrança, e suas lembranças volta e meia o perseguiam.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Desmemórias- capítulo ?

O apartamento tinha as luzes apagadas. Ele tentava não fazer barulho, mas lhe incomodava um pouco o fato de não poder se sentir a vontade. Tinha visita no quarto extra. Lhe parecia confuso quem estava lá, se um parente ou alguma outra pessoa. Os dias passavam confusos a ele.
Achando que nada que fizesse acordaria o [a] hóspede, abriu a cortina da sala. Olhou pro céu negro-azulado. Um imenso relógio digital no topo de um prédio ali perto marcava 04:00hs.
Ficou alguns segundos calado em seus pensamentos, avaliando aquelas luzes que jamais paravam de piscar. Ele mal dormira, e nem mesmo o fato de ter alguém no apartamento lhe impediu de dar uma das costumeiras voltas pela rua quando o sono não lhe encontrava.
A vontade na rua que já apresentava certo movimento [ou ainda apresentava movimento], ele andou alguns metros até a padaria da esquina.
24 horas. Ele lia o letreiro de neon, e tinha impressões retrô do que seria aquele lugar 30, 40 anos antes. Gostava de parar pra pensar em coisas tolas, que outras pessoas ignoram. Pediu, como sempre, a maior das xícaras com um forte café, acompanhado de conhaque. Se aquilo lhe dava disposição para o dia era um mínimo detalhe, o fazia porque gostava, talvez por vício, talvez por não ter nada mais a fazer num horário insólito como aquele.
Ao menos lhe ajudava a cobrar consciência, e ele começava a lembrar mais claramente do que vinha acontecendo. E se arrependeu, culpou o café, falou meia dúzia de palavrões pra si mesmo, ou então para os arruaceiros que passavam ali por perto, talvez.
- Conhaque vagabundo -murmurou, mas pediu uma dose a parte.

Sabia que uma dose de realidade, ainda que às quatro da manhã, é necessária para alguém que foge dela durante o dia.

E lembrou então de que dia era. Sexta-feira. Tinha um 'importante jantar' com a mãe da sua 'amiga'. Ele relutou o quanto pôde, mas como ela deixou escapar algo pra mãe sobre um rapaz com o qual estava saindo, não houve jeito.
Ela, separada de seu pai, já achou por ser um namoro sério, quis conhecer o tal rapaz, estava ansiosa pelo dia do tal jantar. Talvez desejasse com tamanha intensidade para a filha um relacionamento seguro que não se deu conta de que a própria filha não admitiu ser um relacionamento.
A noite cheirava a desastre, ele sabia disso, e seu dia já começava mal.
O café e o conhaque desciam queimando. Decidiu voltar, caso a visita acordasse, e já era mesmo hora de tentar algumas horas de sono.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Desmemórias- capítulo 04

Ele esperava pela consulta no oculista. Vez ou outra sempre encontrava uma desculpa para ver o ex amigo de colégio, lhe perguntar sobre as cirurgias corretivas, os óculos novos... Mas na verdade eram mesmo desculpas. Ele ia lá, já há alguns meses, apenas para olhar a recepcionista/secretária. Tinha desenvolvido uma certa admiração por ela, bonita, de olhar bonito, mas com um algo mais indecifrável, engimático. E quão frustrante era algum desses dias em que passava por lá e não a encontrava, até decorar seu horário de trabalho. E ao cansarem, ambos, de trocas de olhares que eram como pontadas no coração, decidiu-se por esperá-la sair do consultório um certo dia.
A feição dela não era de surpresa. Talvez esperasse por isso, talvez quisesse ter feito algo mais para que ele entendesse sua mensagem. Mas não podia mais do que lançar seu olhar fixo e profundo, esperando dele uma palavra, uma atitude.
O rosto dela lhe povoou a mente por alguns dia. Aqueles cabelos caídos minuciosamente sobre os olhos, a pele branca, alva. Alguns dias com o cabelo solto, era a visão de seu dia.
Pensava nisso enquanto a esperava em frente ao estacionamento da clínica. Abordou-a, conversaram. Veio a carona, o café no barzinho, o jantar. E então, as baladas, as trocas de confidências, o 'relacionamento' estava montado. Tudo ao longo de vários meses, muito bem aproveitados por ambos. Se davam bem, viam-se duas ou três vezes por semana, dependendo de suas ocupações. Ele um freelancer em fotojornalismo, ela fazendo faculdade e trabalhando para pagá-la. Era o 'começo' de algo, nenhum dos dois se preocupava em aonde iria dar.

-

Deitado na areia ele lembrava de quando haviam se conhecido, dos dias em que ele ia ao consultório apenas para vê-la, sem ao menos contar para o seu amigo, patrão dela.
Pensava, sem saber por quê, no começo deles. Incomodava-lhe o fato de terem brigado, mas ele tinha uma leve impressão de que ainda poderiam resgatar o que tiveram antes. Tentava imaginar como lembrando de quando se conheceram. Ao sair do apartamento dela, na noite anterior, pegou o carro e desceu logo em seguida para a praia. Um 'apertamento' que conservava lá a duras penas, e que fôra muito frequentado quando o romance ainda era novo, mesmo sendo eles 'liberais', como gostavam de chamar.
Tinha quase uma certeza de que qualquer relacionamento que tivesse seria assim, penoso, se perguntando freqüentemente se aquilo que eles tinham não seria, de fato, o melhor e mais verdadeiro posssível.
Cansara de pensar. Sabia que não poderia ligar, depois da discussão de ontem. Também não queria ligar. Resolveu ficar o dia na praia, tentar pegar algumas ondas, limpar a mente para voltar com o espírito renovado para a conversa que teriam. Seria a última?

domingo, 2 de setembro de 2007

Desmemórias- capítulo 03

Era uma ligeira discussão, começada por alguma diferença de opiniões. Ele resmungou inocentemente algumas ironias sobre a 'comédia romântica' que assistiam. Ela não gostou. Pediu para que ele não fizesse isso, como se ele não o fizesse sempre, e como se pararia de fazer.
Ele se recolheu de perto dela, desencostando e deixando a cabeceira do sofá, algo que desagradou ainda mais.
Ela levantou, perguntou-lhe por que ele precisava fazer sempre a mesma coisa [desagradável].
Ele respondeu que os hábitos do 'casal' é que deviam mudar, não apenas os dele. Começava um caminho sem volta...

- Sempre os mesmos filmes, sempre a mesma coisa, eu venho aqui, você vai no meu apê. Já caímos na rotina, não adianta. E você sabia que isso ia acontecer! -disse ele como se não houvesse o que contra-argumentar.
- Ahh, me desculpe se tudo ficou monótono pra você, senhor "quero ficar em casa"! -respondeu- Eu te chamo pro cinema, falo pra me pegar no trabalho, invento algo diferente pra cozinhar... E você me diz que a gente caiu na rotina?.. Tem certeza que quer discutir isso?
- Minha cara... Desde o começo. Desde o começo a gente ficou de acordo, não foi? Sabíamos que um namoro comum não ia levar a nada. E era muito bom, você não pode dizer o contrário... Nos vemos de vez em quando, não dá pra enjoar do outro, não tem intimidade excessiva, não tem compromisso. Você no seu canto e eu no meu, tava tudo ótimo! Isso que se chama relação aberta.
[ela tenta interromper e ele continua]
- Mas o que acontece com o tempo?.. A gente acomoda. Mesmo a gente que não tem nada. Você sai menos com as suas amigas pra se divertir, eu desisto de sair pra conhecer alguém novo porque vou ter que te ligar pedindo pra não vir pra cá... Não tem escapatória! Acabamos dormindo cada fim de semana na casa do outro como dois namorados. Pra quê continuar com isso? As pessoas cansam umas das outras, não tem nada de errado nisso e você sabe.
[lágrimas nos olhos dela começam a aparecer]
- Você é insensível cara... Como pode?
- Você sempre soube disso -diz ele, com certa surpresa e reticência- e retoma-
Desde o começo a gente não queria se apegar. Eu avisei e você concordou... Ou talvez foi o contrário...
- Não precisa repetir o que eu disse ou deixei de dizer! Claro que eu concordei, eu não sou burra, não me trate como tal! Mas você quer levar essa vida de solteiro até quando? Não tem ambição? Não vai querer uma família como a que você teve e se distanciou? Por que tudo isso? É tão egoísta assim?? -diz ela tentando esconder os olhos úmidos-
- O que eu escolhi pra mim não tem nada a ver com nós dois...
- Tem tudo a ver! -interrompe ela- Você não percebe... Acha que pode viver assim pra sempre?..
- O que tem a ver o jeito que eu vivo minha vida?.. Qual é o objetivo dessa conversa?
Se você não sabe, eu sei. Tá mais do que claro que nosso tempo passou. A gente se dá bem, claro... Mas assim não pode continuar. Melhor cada um pro seu canto... Se você achar que a gente deve se ver, me liga daqui uns dias... Não tem outra coisa pra fazer... -sentencia ele-
- Cara, eu sabia que você era egoísta, mas você é muito complexado! -ironiza ela, secando as lágrimas- Quem te fez mal hein?.. Alguém te ignorou e agora você desconta em todo mundo ?
- Não dê uma de terapeuta agora... Vai falar coisas pra se arrepender depois?.. Pois então continua sozinha, eu to indo pra casa... -e caminha para a porta, rapidamente pegando sua jaqueta e suas chaves -
- Cara, uma hora você não vai ter mais quem te queira... Resolve o teu passado antes que não sobre mais nada. -ela finalmente se cala, após deixá-lo abrir a porta-

E ele vê a conversa terminar com um gosto amargo na garganta. Perdera a discussão. Não que valesse algo, mas ela tinha razão, e isso o desagradava. Não gostava de perder.
Saiu caminhando pelos corredores e elevadores com o olhar distante, desfocado, sem fixar em coisa alguma. Não queria pensar em nada, ela tinha razão. 'Que se dane!', pensou...


-
Observação: O número de capítulos, bem como sua ordem, poderá ser alterado conforme eu escrever... No próximo capítulo eu começo a 'ordená-los' corretamente ;]

domingo, 19 de agosto de 2007

Desmemórias- capítulo 02

Ele acordou com a claridade invadindo o quarto, como se gritasse para ele que já era hora de se levantar. Sabia que era sábado, mas não conseguia lembrar como terminou a noite. Olhou para o lado e se lembrou. Dormira com uma amiga, com quem saía ocasionalmente. Ambos no auge da juventude e forma física, lá pelos vinte e cinco anos. Ele morava sozinho há pouco mais de 1 ano, e nesse tempo aprendera a se virar. Mas não era só pela companhia que saía com a amiga. Vez ou outra, quando ele não tinha muito o que fazer no fim de semana, além do trabalho que sempre restava, ele a chamava, pois era inevitável que ela viesse e não visse algo que faltava arrumar ou limpar em seu apartamento. Era cômodo, ela sabia, ele sabia, mas não falavam a respeito. Era mecânico.
Se por um lado a falta de sentimento de ambos era motivo de desconfiança entre seus amigos, ele dava de ombros. Sabia que, ainda mais quando tinha que se virar por conta própria, um relacionamento se divida em muitos outros fatores do que simplesmente os sentimentos. Mas, para todos os efeitos, eles não estavam namorando. Era algo para apenas quando não tivessem melhor companhia, se davam bem, riam juntos assistindo a um filme ou dançando num clube e não passava disso.
E ele não deixaria passar. A comodidade era confortante. O trabalho exaustivo de segunda a sexta chegava a deixá-lo sem vontade de aproveitar o fim de semana, portanto ter alguém por algumas horas ao seu lado, e sem cobranças, era algo perfeito para ele.
Quando juntos, não conversavam muito a respeito de seus passados afetivos. Até se desinteressavam sobre o assunto, tanto que não sabiam quase nada a respeito um do outro. Acordo feito ainda quando eram simples amigos, a custo de algumas bebedeiras juntos e um passo dado por ele, aproveitando-se da desculpa do álcool para dar o bote. E a falta de conhecimento sobre o outro é que mantinha o barco navegando, pois trazia a curiosidade de perguntar algo como pretexto para se verem, e quando se encontravam deixavam de lado esses assuntos tediosos para apenas se divertir, em todos os sentidos.

Ele fez o café e tomou sozinho, não queria e nem podia acordá-la, pois seu mal-humor matinal era ainda mais latente quando combinado com bebida na noite anterior...
Deixou a louça automaticamente na pia para que ela lavasse, não por egoísmo, mas por ser um gesto corriqueiro. Foi varrer e tirar pó de alguma coisa, ligando baixo o som na saleta, pegando mais um pouco de café e combinando a tentativa de limpeza com seu hábito de pegar a câmera fotográfica e procurar pela janela algo que lhe interessasse captar.
O som do obturador funcionava como seus olhos, que captavam vontades e sentimentos dos outros como poucas pessoas conseguiam. E, claro, volta e meia os usava a seu favor, como um vendedor persuasivo.
O relógio da saleta marcava 11:30. Queria ter dormido mais, porém não se lembrava a que horas de fato ele teria deitado. Pensou olhando para baixo na pequena sacada que ela teria dirigido depois de beber mais uma vez, mesmo com sua repreensão. Ele não tinha carro, ainda não pensava em ter um, e sempre que saíam deixava a tarefa pra ela, que ainda não tinha aprendido seu limite de tolerância ao álcool. Já fizera muito em largar o cigarro a seu pedido, pois detestava o cheiro que ficava no apartamento. Pesava os prós e os contras dessa 'relação', e antes mesmo de chegar a uma conclusão esquecia do assunto e resmungava sem perceber algumas palavras que sentenciavam os pensamentos.

Ao ouvi-la levantando e indo ao banheiro, aumentou um pouco o som, esquentou um pouco mais o café e encontrou-a ali mesmo no corredor. Com um beijo e uma leve prensa na parede lhe disse 'boa tarde, bela adormecida'. Ela o beliscou, retribuindo o beijo, e lhe respondeu que tentava criar coragem para sair da cama. Seguiu para a cozinha e ele deu um leve tapa no bumbum, só para ouvir de resposta o 'danado!' que ela soltava com um misto de voz rouca e um pouco de ressaca, uma combinação viciante.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Desmemórias- capítulo 20 e uns...

Apartamento. Os sofás dispostos em 'L', cada um no seu. Era frio, mas fazia sol, por isso a janela impedia o ar mas deixava a luz entrar.
Alguém na cozinha, a mãe dela lavando a louça do café, talvez pós-almoço. Talvez a louça que ele se dispôs a lavar mas não o deixaram.
A tv dizendo alguma coisa com a qual ele não se importava. Tinha os pensamentos voltados para uma única razão, concentrados na direção do seu olhar. Olhava ela, levemente encostada no sofá, puxando o cobertor até os ombros. Deixava cair o cabelo, liso e castanho, um pouco para frente.
Ele continuava a olhá-la e dizer algumas coisas rápidas, até que ela lhe respondeu com um olhar fundo, avaliador e ao mesmo tempo grato. Grata talvez por ele apenas olhá-la daquela forma. Certo era que seu brilho era transcendente a tudo.
Então chega o pai dela, seu 'talvez futuro sogro', e extasiado como estava pelo olhar dela, não ouviu seus passos, sendo pego de surpresa.
Comentam algo um com o outro, ele puxa o cobertor até os joelhos, esticando os pés sobre o tapete, e agora passa a olhar para ela com alguns intervalos, mas sem perder sua fixação.