domingo, 7 de dezembro de 2008

Coração Stand-by

Há bastante tempo atrás havia uma máquina, e um operador. A máquina sempre funcionou bem, e o operador sempre a operou da maneira correta.
Há algum tempo
atrás um led foi acionado. Ele entraria em funcionamento toda vez que o operador gostasse -demais- de uma operadora, serviria como um 'alerta'. Servia também para seu propósito inicial: proteção.
Sim, proteção, pois ele surgiu após uma revolução, que, como sugere o nome, devastou. Trouxe muita coisa boa também, antes que se pense o contrário. Porém, inevitavelmente o led foi acionado -para melhor funcionamento da máquina, que passou a trabalhar sob baixo consumo de energia. Ou seja: estava menos quente, ou mais fria se preferir.
Não é um daqueles casos de ficção da máquina que se volta contra os humanos. Na verdade pode até ser, mas isso ficará a cargo do seu julgamento ao final deste relatório, se é que a complexidade dele não será tamanha que impossibilitará isto.
Antes do led a máquina funcionava bem, porém consumia muita energia. Para alimentá-la eram necessárias doses diárias de adrenalina e relacionamentos -diversos, por sinal. Mas o operador conseguiu mantê-la nessas condições, talvez até conseguisse continuar se não houvesse a revolução.
Mas, ela veio.
E então no começo o led parecia incômodo. Era estranho deixar a máquina 'meio ligada' e 'meio desacordada', mas o operador percebeu uma notável diferença nos anos seguintes: a máquina não dava problemas, não se envolvia em questões que não lhe fossem determinadas pelo operador e, sendo menos quente, não necessitava tanta alimentação, deixava o operador com tempo livre para procurar outros gostos, conhecer mais pessoas. Porém, a máquina não lhe deixava conhecê-las a fundo, pois aquele led sempre piscava quando algo assim perigava acontecer, lhe tirando a atenção e tendo que deixar as pessoas com a impressão de que ele ficara dias, semanas sumido, quando na verdade estava 'discutindo' com a máquina se o fato de acender o led sozinha era ou não sua função.
Ali já se percebia que a máquina interagiu tão bem com o operador nos primeiros anos de vida que já podia tomar decisões antecipadamente sem que ele lhe ordenasse. Ótimo por um lado, pois ela repelia quaisquer acontecimentos que ele outrora lhe havia ordenado, criando um padrão. Porém, este padrão não poderia ser aplicado à todas as pessoas, pois cada uma tinha uma máquina diferente, e pensamentos e interações diferentes.
Com isso o relacionamento do operador com a máquina já não era 100%. Tudo bem, ainda conviveram perfeitamente por mais alguns anos, algumas vezes o operador se cansava da máquina, e a máquina não se cansava do operador, pois ela era máquina.
E o led sempre acionava-se sozinho quando o operador quase conhecia a fundo outras máquinas de outros operadores [as]. Isso gerou um certo desconforto no operador, pois mesmo que ele outrora ordenasse a máquina a acender o led de atenção, algumas vezes ele realmente gostaria de saber o que se passava em outras máquinas de outras operadoras. Queria saber se alguma operadora passava dados dele para sua própria máquina. Ele [o operador], precisava saber disso, pois ele era um humano e tinha as inseguranças e necessidades de um humano, ainda que mais controlado que os outros porque a sua máquina era teoricamente mais inteligente que as outras devido ao baixo consumo de energia, entre outros fatores.
Era um humano operando uma máquina. Já a máquina, mesmo 'quase metade' humana, não precisava saber de outras máquinas, pois máquinas avulsas não conseguiriam trocar informações sobre elas mesmas. Precisavam de operadores [as] para isso. E cada máquina era 'parte' de cada operador [a], se bem que alguns operadores a tiram da tomada e saem conhecendo outras máquinas como se diz 'bom-dia', e outros ainda a deixam ligada direto, o que provoca sérios riscos de mal-funcionamento em virtude de um problema classificado pelos humanos operadores como tédio.
Mas voltemos então. O operador queria saber se outras operadoras passavam às suas respectivas máquinas informações sobre ele [e sua máquina também, claro]. Então ele combinou com sua máquina de tentar ir um passo mais adiante no relacionamento com as pessoas, e a máquina concordou sob a seguinte condição: se o led piscasse, era sinal de que ele estava correndo muitos riscos, e teria que se retirar -ou sumir, como entendem os outros operadores [as].
Pois então o operador tomou esse passo a frente, mas sempre voltava porque tinha a certeza de que o led piscaria se ele continuasse a trocar informações com outras operadoras. Ficara refém de sua própria máquina, mesmo ela não tendo culpa, afinal, era uma máquina.
O led já não havia sido acionado há um tempo, pois para o operador o tal 'pisca-pisca' havia se tornado uma mania. Sozinho, sem a interferência da máquina [que não podia aconselhar o operador, pois era uma máquina] ele mesmo acionava o led 'mentalmente' antes de trocar informações relevantes sobre ele -e sua máquina- com outras operadoras e suas respectivas máquinas.
Bom, a história parece confusa e cheia de reviravoltas, mas na verdade não é. Se chegou até aqui, tenha a certeza de que lendo mais uma vez -ou mais algumas, pois alguns operadores [as] e suas respectivas máquinas são mais lentas que as outras- você entenderá. De fato, a própria máquina em questão é lenta, pois acompanha o ritmo de seu operador.
A máquina -contando o período a partir do surgimento do led- já tinha uns cinco anos. Não era velha, longe disso, mas passou a precisar de mais calor gradativamente. E para buscar mais calor era necessário o operador ir buscar mais informações de outras operadoras e suas respectivas máquinas [algo que os humanos gostam de chamar de afeto]. Estava desenhado ali um caminho que colocaria em risco o bom funcionamento da máquina, do led e do operador: ele buscou mais e mais informações, e sem notar [pois é para isso que existia a máquina] o led deixou de acender uma única vez. Foi o bastante para ele colocar a máquina e a si próprio numa situação embaraçosa, pois as informações conquistadas davam a entender que uma operadora [e sua respectiva máquina] gostariam de ter a companhia dele [e, claro, da sua máquina e talvez até do led]. Neste momento a máquina, inábil nos assuntos particulares dos humanos operadores, disse que não poderia ajudar o operador neste caso, e ele ficou no que chamam os humanos numa sinuca de bico. Caberia a ele então resolver sua pendência com a operadora, e ela por sua vez com sua máquina.
E então o operador fez uma última pergunta para sua máquina: "Você acha que eu devo fazer com que eu e ela -e você e a máquina dela- trabalhemos juntos?"

E é por isso que este relatório de erro está tão extenso, caro "Criador", pois como pode perceber não sou eu que tenho a resposta para a pergunta de meu operador, e de fato ele deixou o meu led em um constante 'stand-by' porque até eu conseguir a resposta, nem eu poderei me reportar a ele, e nem ele poderá me passar outras funções.

P.S.: Este relatório poderá ser mostrado a quaisquer humanos [ou sobre-humanos] que o Senhor achar por bem, pois qualquer ajuda neste momento é bem-vinda, e as super-máquinas que aí estão com o Senhor talvez saibam a resposta que eu preciso dar a ele.

P.S.2.: Desculpe por reportar-me na terceira pessoa do singular, caro Criador, pois é delegado apenas aos humanos apresentar-se na primeira pessoa, algo que eles chamam relações pessoais.

P.S.Final.: O operador entrou em um estado de insônia, algo que -dizem os humanos- é causado por preocupações que lhe tiram o que chamam de sono, que é algo que eles fazem para descansar e repor as energias. Por isso, esta máquina que lhe fala está seriamente preocupada com a saúde física e mental do operador, pois me parece que para os humanos é extremamente necessário desligar-se de suas máquinas por algumas horas diárias.


Ass.: Uma máquina modelo 1984-14/07 em stand-by.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Dani, Ela

Começou do nada, uma voz chamava meu nome
Eu olhei pra baixo [pra baixo mesmo] e lá estava
O sorriso era o mesmo de hoje
Isso [felizmente] não irá mudar
Algumas coisas mudaram, vão mudar
Também felizmente, pois ela só muda pra melhor
Alguns dias ou meses mais pra frente
Eu via penteados e cores diferentes
Caras, bocas e caretas
O rosto -sempre de boneca- aos poucos ficou mais firme
E as caretas ela aperfeiçoou

E eu fiquei um tempo longe. Ela se preocupou
E eu sumi ainda mais. E ela não desistiu
E fui de mal a pior. Mas ela sempre me aturou

Foi da garota à quase mulher que já é
E o que falta sem dúvida é pra coroar o resto
E vejo nas fotos
Do chão de taco em frente ao espelho
Ou agasalhada naquele inverno tenebroso
Séria [raramente], sorrindo [quase sempre]
Linda, invariavelmente
Em preto e branco ou cores

E é justamente por uma dessas, em verde
Que só tenho a certeza de que algo nunca vai mudar
Suas qualidades... Não posso evitar, é meu ponto fraco
[O sorriso dela, e ainda mais em verde]


Thi- 21/11/2008


sábado, 21 de junho de 2008

Desmemórias- capítulo último

A dúvida em sua cabeça era se ele seguiria lembrando desses momentos, um turbilhão deles, pelo resto de sua vida. Queria colocar o ponto final, porém se sentia perdido para isso. Chegara a um ponto chave: ou avançava ou ficaria -eternamente- parado.

Da janela cinzenta do apartamento o olhar se perdia em algum ponto qualquer. Lembrava de quando o namoro se tornou ‘oficial’.


Com um casal de amigos, desciam os quatro para a praia, o apartamento dos pais de um deles a muito custo e promessas de bom comportamento fora liberada. Então, apesar do clima de festa dentro do carro ele o guiava com a seriedade de um motorista profissional.

Chegaram ao final da tarde de uma sexta-feira, ainda aproveitando a hora boa do sol. Mal deixaram as coisas no apê e já seguiram eufóricos para a orla.

O outro casal, já devidamente assumido e notavelmente mais ‘entrosado’ dava a eles a sugestão que ambos tinham em mente, e parecia que o momento se aproximava cada vez mais.

Achado o lugar ideal na areia, ele não pôde deixar de notar o interesse do salva-vidas em final de turno na sua... ficante. Eles eram isso, ainda recém-saídos do colégio, nada assumido. Encheu-se de coragem e juntou-se às duas garotas, que passeavam pela areia, recusando com muito custo as investidas masculinas. Ao alcançá-las, pediu a amiga para falar com ela ‘a sós’, e cobrou-lhe:


- O que você tava falando com aquele salva-vidas bombadão?

- Eu não tava falando, ele é que veio com conversa... Mas por que a pergunta?

- Nada... Acho que tenho o direito de saber ?

- Ah tem?.. Interessante você... [com um leve tom de ironia]

E pegando na mão dela continuou:

- Ta na hora ?

- Na hora?.. É, acho que sim - e ela respondeu-lhe olhando nos olhos-.

- Vamos namorar de vez e chega de enrolação!

Em resposta, ela não concordou, não negou, não insinuou nada, como de costume. Apenas lhe disse:

- Eu falei pro bombadão que eu tinha namorado e que não ia demorar pra ele vir atrás de mim...


E de nem tão longe assim a amiga correu e rapidamente chegou para abraçar os dois e jogá-los na areia. “Agora vão tomar um banho de mar juntos, namoradinhos!” acrescentou.


O resto do final de semana, ainda que desnecessário dizer, mas ele lembrava de cada detalhe, fora mágico.




/===/


Com o carro emprestado [daquele mesmo amigo paciente], ele chegara a um cemitério. Caminhando passos que pareciam demorar anos chegou ao túmulo dela. Parou, em pé, imóvel e ali ficou por alguns trinta segundos. Olhou a mão tremer ao tirar do bolso da calça um papel com algumas frases escritas numa letra de mão bagunçada e tão itálica que só poderia ter sido escrita deitado.

Olhou o papel e olhou o túmulo. Amassou-o e devolveu ao bolso, e com uma altivez e paciência impressionante começou a falar, pausando e olhando em volta vez ou outra, mas seguindo:


- A gente discutia o ‘pra sempre’ e o ‘amor eterno’. Tivemos umas boas até... Eu não concordava com você que tudo era pra sempre e você desgostava do meu pessimismo - ou realismo.

Você se foi sem estarmos juntos e já passei alguns anos me perguntando, me remoendo, tentando acreditar que seria possível fazer diferente. Hoje eu acredito... Ou melhor, quero acreditar que tinha que ser assim, mesmo sem jamais entender por que e ainda ficar mais pessimista sem esse alguém pra discutir o que nunca terá uma verdade definitiva.

- Espero que o que você sentia naquela hora tenha mudado. Ficamos juntos por quase três anos, acho que ao colocar na balança também pra você o lado positivo vai ser maior.

E eu digo isso agora porque sei que você jamais deixaria de se interessar ou se preocupar comigo: eu ainda estou aqui. Levanto, caio, levanto, caio e levanto. Acho que precisava conversar com você, ou com alguém mais, ou até comigo mesmo. Não tenho feito isso ultimamente, se você notou... Por isso vou começar sendo sincero comigo mesmo.

- Se você já está curada aí... Se aquilo que você tentava me fazer entender está aí, então vem me dizer que você ta bem... Vem me dizer que ainda vale a pena estar aqui...

Eu dava aquele riso irônico ao ouvir você falar de ‘destino’. Não sei se estou perto de entender agora, mas acho que eu avaliei pelo lado errado: não se pode pensar que está tudo definido, que estamos aqui com nossa vida toda traçada. Se eu ainda to no meu juízo perfeito significa que cabe a mim escolher meu rumo e seguir da melhor maneira possível. É o que pretendo fazer daqui em diante. Se eu disser que vou te deixar de lado estarei mentindo feio, não vou. Mas pra merecer isso que você dizia existir ‘depois que a gente morre’ eu vou tentar andar com as minhas próprias pernas.

Mas por favor, não deixa eu me perder...

Agachou para olhar a lápide. Tirou do bolso o papel amassado e tentou fazê-lo voltar à forma original. Deixou assim mesmo ao lado das flores que deixou no túmulo.

Levantou-se, calado e assim seguiu. Apenas olhou tudo, uma despedida talvez, um até breve.




/===/


Desceu novamente à praia. Se prometia ser a última vez que deixava tais lembranças o guiarem. Lá chegando parou o carro perto da praia, vazia no inverno e com ressaca.

Sentou numa pequena duna que ia se suavizando até se juntar à areia da praia, de calça e blusa e ficou ali, olhando o céu cinza, lembrando das ‘lições de moral’ dela, das palavras bonitas, do sorriso.


“Pra você encontrar algo bonito mesmo que seja no caos é só fechar os olhos, pensar em algo que goste e abrir de novo pensando nisso.”


“É só querer ver que sempre tem algo além do que a gente enxerga.”


“Sempre ainda terá algo por fazer ou alguém pra encontrar, não importa o que aconteça.”


E pensando nisso tudo, olhando a linha do horizonte ele procurava pelo céu azul e o sol, que não muito distante, sobre o mar, estava brilhando.


FIM








Para D.

Porque esteja onde estiver eu sei que você sempre vai me empurrar pra frente...

domingo, 25 de maio de 2008

alvorece/alvoroço

Da noite pro dia tudo muda
Ao pôr do sol a luz se esvai
Entra em seu lugar o que é artificial
Mero contraste com as pessoas
Mais felizes e verdadeiras, as que dela gostam
Ou cansadas -porém honestas- as que gostam do dia

A noite pertence às sombras
O dia aos reflexos

Sombras ou silhuetas nas ruas
As mal-iluminadas ou as que, mesmo com a luz
Se tornam assim porque o que é artificial
Se dispersa, é da sua natureza

Os reflexos do dia espalhados
Nos vidros, nas vitrines, nos óculos escuros
Barreira segura para os que gostam de olhar
Ou até analisar friamente a outros
Olhos que espiam ou as pernas que desfilam

Mas da noite pro dia tudo muda
Os postes e faróis criam o ambiente perfeito
Nos fazem observar outros detalhes
E quando é novamente dia
As percepções estão trocadas
E o que era luz não necessariamente é mais

À noite pertencem os reflexos
E o dia revela as sombras

Reflexos turvos provocados pela garoa noturna
A beleza desfila com mais provocação
Pouco importa que demore a se chegar a algum lugar
Se há boa companhia tudo é muito mais belo

E ao dia restam as sombras das ruas
Pernas apressadas no sol do meio-dia
Óculos presos aos cabelos
Sombras impressas por todo lugar

A vida que não pára
E continua a se transformar
A beleza está em tudo a toda hora
O segredo é saber aonde olhar

sábado, 3 de maio de 2008

Desmemórias- capítulo penúltimo

O relacionamento já não era o mesmo. Após um ano com ambos fazendo cursinho, se vendo diariamente, as discussões iam aparecendo –mesmo para um casal equilibrado e que se dava bem.
O fim do ano se aproximava, e era hora das incertezas de ambos darem lugar a definições. Ela já escolhera seu caminho: iria para o interior. E sabia que para isso teria que dar um tempo –tanto nas brigas quanto no próprio relacionamento- porque durante alguns meses não poderiam se ver. Pensava ela talvez ser melhor assim, se o relacionamento fosse forte o bastante esse tempo apaziguaria as diferenças.
Pensava ela.

Então quando contou a ele a reação não foi a esperada; Ele argumentou, disse que ela era precipitada, que não daria certo, por fim perguntou da relação...
E ela lhe sentenciou com um ‘dar um tempo’.
A ele coube deixá-la falando sozinha, pediu pra o esquecer, a raiva e a mágoa o dominavam. Ela pensou em ir atrás, mas o deixou. Naquela noite não voltaram juntos, ele arrumou uma desculpa.

Passaram poucos meses e ambos entraram na faculdade. Ele em São Paulo, ela iria de fato embora. Mal se falavam, apenas buscavam os amigos para se evitarem, mas ela quis, na véspera, falar com ele. Apenas lhe desejou boa viagem com um tom de indiferença. Ela sentiu por isso, mas seus objetivos eram claros, e ainda acreditava que a mágoa dele passaria com o tempo.
No dia seguinte, já com algumas roupas e pequenas mobílias para o apartamento alugado, ela seguiu para a viagem de algumas boas horas com uma amiga de colégio, que moraria e estudaria com ela. Após uma parada pra abastecer e esticar as pernas, lá pelo meio do caminho, elas tomam um café e conversam sobre o que deixaram para trás.
Ao ter que consolar a tristeza da amiga por sair da asa dos pais, bateu nela mesma uma certa tristeza que tinha nome, passado e –como um dia imaginou- futuro. Quis tentar diminuir a apatia da amiga contando das suas perdas, enxugaram as pequenas lágrimas, se recompuseram e tocaram em frente.
Perto de chegarem ao destino, exaurindo o toca cds com suas várias músicas prediletas, caia a noite e elas entravam numa perigosa estrada de mão-dupla, e a neblina completava os fatores de risco.
A amiga, em tom fúnebre, dizia que tinha algo importante para contar e que tinha que ser naquela hora. Ela olhou para a passageira e lhe disse para continuar. “Fiquei com ele”, sentenciou baixando a cabeça.
“Quê?!”, com uma freada brusca e levando o carro para o acostamento ela respondeu.
“Foi uma semana depois que vocês terminaram, numa balada... Ele bebeu, eu bebi... Desculpa amiga.”
Ela engoliu a raiva e mentalizou para descontar nele. “Esquece!”, nervosa e reticente ela botou fim à conversa e seguiu acelerando.
A amiga pedia para ela reduzir quando seu celular piscou, e então pediu a passageira para olhar a mensagem que chegava. “É dele”, disse. “Lê pra mim”, respondeu.

“Preciso te contar algo, fiz besteira... Sei que você não quer conversa mas me liga, beijos.”

E então tudo ao seu redor estava em câmera lenta. Não ouvia a amiga pedir para diminuir, não via a estrada nem os carros. Pensava em um milhão de coisas, se culpava, o culpava...
Não havia tempo nem era o lugar para tantos pensamentos. Jogou sem perceber o que fazia a direção do carro para o sentido oposto. Sua amiga gritava e a ela aquilo lhe parecia um pesadelo do qual não se consegue acordar. A amiga tirou o próprio cinto por reflexo e colocou o próprio pé no pedal do freio. Um carro no sentido contrário conseguiu jogar para o pequeno acostamento. Elas não.

O carro triscou no outro e capotou. A amiga imediatamente fôra arremessada do carro. Ela deitada no asfalto, com o celular na mão, só pôde ver uma última noite estrelada, e cerrou os olhos.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Luto

"T" sou eu mesmo.


-
T. diz (22:48):
não faz sentido mesmo irem os melhores e ficar os piores

T. diz (22:50):
eu acredito, ou quero acreditar que isso tem um propósito... que os bons estão indo porque nós precisamos todos ser melhores

T. diz (22:51):
que vai chegar um ponto que a humanidade vai estar insuportável, e aí sim vamos sentir falta de verdade dos que são bons.. quem sabe aí as coisas mudam
mas o que eu acho ou o que eu acredito não serve pra consolar, eu sei
-


É esse vazio que a gente sente quando perde alguém que devíamos sentir todo dia. Só um sentimento de culpa pode fazer alguém que não acrescenta nada aos outros repensar sua vida.
Alguém que não podia ser desse mundo mesmo. Sempre quis o bem dos outros antes do seu. Sempre fez mais por mim do que eu dei em troca.
No fim das contas, a tristeza é mais pelos nossos erros aqui do que pela falta, pois quem foi certamente vai estar bem melhor do que nós. Nós, que ficamos aqui, que somos os tristes e incompletos, e temos que pagar muita penitência até chegar nossa hora.
Tenho até inveja, confesso. Quando for a minha vez eu já terei desejado ir antes. O que não siginifca que eu seja suicida ou masoquista. A vontade de ir é a vontade de ser alguém melhor, o que não sou.

Usei este espaço para um desabafo pessoal. Logo volto a postar.
Obrigado.

domingo, 30 de março de 2008

Rascunho

[ou rabiscos...]


-

Como seria a forma certa de começar?
Poderia eu falar de seu olhar
Ou da sua destacada brancura
Ou então de sua doçura, que tão rápido a alguém faz conquistar

Seria um desfile de adjetivos
Que até, talvez, se tornariam repetitivos
Pois não seria a primeira musa
Também não seria você homenageada pela primeira vez

Escrevo, então, por este bloco de recados apertado
Letras tortas de uma caligrafia destreinada
Iluminada por uma luz apenas, e distante da vista
Sentado à cama, pois é sempre a esta hora
[para não falar das outras]
Que me tomas os pensamentos
Me roubas o sono
E me deixa os sonhos

Só me resta falar, então
Sobre os sonhos que me aparecem -no sono ou não-
Farei portanto um apanhado deles

Da pele branca levemente fria -mas viva-
Juntamente com seus olhos e coração, que aquecem
Se tornando tensas a um toque meu, muito ansiado
E ganhas rubor e calor, o demonstrando com seu sorriso

E sinto comigo que o sonho, de tão bom
Está para acabar
Adormeço, ou então o sol vem me acordar
Até a noite seguinte -e volta e meia durante o dia-
Tornas a voltar...

sábado, 29 de março de 2008

Rascunho de 'Rascunho'






Apenas uma consideração: escrevi nessas pequenas folhas o esboço. Postarei a seguir o texto 'a limpo'

[minha letra não é assim tão feia, mas o tamanho do bloco não ajudou!]

segunda-feira, 10 de março de 2008

Desmemórias- capítulo 05

Um pequeno grupo, não mais que 5 pessoas [entre homens e mulheres] caminhavam na rua movimentada no começo da noite, por volta das 19 horas. Entre risadas e goles de bebida que os apressados compraram antes mesmo de chegar ao barzinho, o programa daquela noite, um casal se destacava. Não apenas por ser o único casal, mas de certa forma cativavam aos outros. Estavam todos animados, ansiosos por uma noite que de certa forma era até simples: apenas uma reunião num videokê, com direito a tomar todas sem se preocupar pois ninguém teria que dirigir [mas teriam sim que poder andar para voltarem todos acordados até o destino de cada um].
Inexplicavelmente conseguiam fazer piada de tudo, das luzes da cidade efervescente, da cor do céu, da falta de anúncios publicitários. As risadas até então eram o som da noite.

Som esse que mudou no barzinho: pegaram uma mesa, continuaram a beber, e conversar, e rirem. Um ou outro se aventurou a cantar, e evidentemente, arrancava risos de seus companheiros.
O casal não destoava dos outros, pelo contrário, pareciam ser o motivo pelo qual o grupo estava lá, ainda que sem estar completo, o que de fato era difícil.
Os dois conversavam, riam juntos e curtiam juntos a noite. Arriscaram também um dueto e para surpresa de todos se saíram bem, arrancando aplausos.
Adentrando a madrugada, todos já devidamente quase-alcoolizados, as risadas eram mais freqüentes e mais fáceis. O grupo já dispersava com mais facilidade, um ia tentar a sorte com a garota de outra mesa, outro quase se perpetuava no microfone. O casal já mais leve, decidiu levantar, procurar um canto mais tranqüilo, o que era natural.
Mais uma meia hora depois e eles retornam. Não fizeram nada indevido, pois o lugar era pequeno e movimentado, mas conseguiram um pouco mais de atenção apenas para si próprios.
Todos já começavam a concordar que o caminho de volta era longo e seria a hora de irem, mesmo porque ainda sobrariam algumas garrafas para abastecer o viagem...

O casal andava, como todos os outros, um pouco cambaleante. Todos riam, numa freqüência ainda maior do que no começo e do meio da noite. As piadas e estórias mais interessantes e cômicas eram contadas agora. Estava lá um grupo sem medo de enfrentar as ruas vazias, a desconfiança alheia e os julgamentos de quem os via. As caminhadas de ida e volta eram apenas um pretexto para todos se encontrarem, algo que semanalmente já era muito difícil.
Discutiam teorias e desfilavam soluções. O casal falava, discordavam de si para depois concordarem em tudo.
Estava, naquele pequeno grupo, tudo de bom que se podia imaginar de relacionamento entre as pessoas.

E ele, sentado na prancha pensando em tudo e ao mesmo tempo em nada, deixava o olhar no horizonte. Por que no dia seguinte à briga ele lembrara de coisas do passado, cinco anos antes?
Se convenceu de que pensou demais o dia todo, e ainda tinha a noite que se aproximava, e o domingo de manhã para resolver o que fazer.
Saiu do mar carregando num braço a prancha, fincou-a na areia e se secou. Olhou o celular apenas para averiguar mensagens recebidas ou ligações perdidas. Nada, ele sabia que não haveria nada.
Olhando a data percebeu que seu aniversário se aproximava. Já passava dos 25, e com todas as pressões do mundo para que ele fosse um 'adulto normal, casado e com filhos, consumidor e consumista' [e extremamente infeliz], considerou o dia um tanto melhor.
Resolveu dar de ombros e seguir suas próprias opiniões, e a única idéia que tinha na cabeça naquele momento era de seguir como estava. Em time que se ganha, não se mexe.

sábado, 8 de março de 2008

Desmemórias- capítulo ??

Ele, um formando do 3º colegial. Ela, uma garota do 2º ano.
Um festival cultural, ou algo do gênero. Barracas montadas por todos os lados, cada qual com seu tema. Mas a que mais chamava atenção era um 'experimento científico', uma piscina que contava com a devida caracterização e algumas parafernálias para simular as ondas de um oceano. Não só o maior chamariz como também o que mais impressionava, exatamente por destoar de todas as outras.
Ele um dos responsáveis pela caracterização, e no horário de descanso de um ou outro também cuidava do experimento, que era o principal objeto [pelo menos para os estudantes que buscavam nota pela participação].
As pessoas passavam, naturalmente curiosas, perguntavam, ele com muita paciência sempre respondia tentando não parecer automático. Mas não podia deixar de notar, numa barraca logo à frente, ela, a estudante do 2º ano que já há algum tempo lhe chamava a atenção.
Ele, um tímido estudante do 3º ano, nada 'famoso' por sua popularidade no colégio. Na sua cabeça visualizava uma bela praia de água bem azul, num entardecer já quase noite, com ela ali por perto, querendo estar com ele. Tudo isso enquanto repetia várias vezes o que significava tal engenhoca, e ao mesmo tempo não perdendo de vista a garota do estande à frente, que, acreditava ele de longe, se tratava de algo relacionado a Culinária.
Ele, que nos poucos momentos de descanso procurava por ela, julgava que a garota sequer o notava ali, tanto pela correria do evento quanto pelo simples fato de ele mesmo não chamar tanta atenção...
Era quase meio-dia. Perto da hora do almoço e do tempinho para o descanso, antes de retomar para o resto da tarde. Finalmente podia revezar com outros alunos [que, ao contrário dele, não se importavam em chegar mais tarde]. Foi tomar uma água, passear pelos estandes. Mas o que queria mesmo era chegar mais perto dela.
Chegando no estande ele pôde notar que era uma oficina de culinária, de doces e salgados simples. Ensinavam a fazer e também cobravam pelos mesmos e ele logo pôde vê-la literalmente com a mão na massa. Nunca haviam se falado, ele apenas a observava de longe.
Então lhe perguntou se era fácil fazer aquilo tudo, se ele podia aprender, ao passo que ela lhe respondeu sorrindo, mas naturalmente simpática como sempre fôra com todos.
Parou ali mesmo para fazer um lanche e perguntou a ela quando faria uma pausa. 'Já já to saindo, 5 minutos', disse ela, quando ele tomou talvez a mais ousada atitude de toda sua curta vida: lhe perguntou se gostaria de ir à sala de descanso [também uma parte do projeto, um ambiente com puffs e música suave para as pessoas relaxarem].

Foram então, caminhando a passos ligeiramente tranqüilos para quem acabava de sair de uma 'confusão'. Ele, talvez pela situação inédita de mais liberdade em relação ao dia-dia do colégio, perguntava coisas a ela como se soubesse o que fazer para atrair a atenção dela. E ela, não a 'mais conhecida' do colégio, se é que havia isso, mas conhecida sim por ser simpática e fácil de lidar com pessoas, desde que não fossem egoístas.
Então, para aproveitar da ousadia, já perto da sala de descanso, lhe perguntou se já o havia notado no colégio, já que estudavam ambos há vários anos lá.
A resposta dela, que saiu rápido de sua boca lhe causou o efeito contrário: ficou sem ação, sem perceber por quanto tempo. 'Mas claro! 10 anos estudando aqui, dá pra conhecer quase todo mundo. Sempre te vejo com os caras do 3º ano'

Aquilo lhe martelou na cabeça e tornou suas falas monossilábicas mesmo quando já estavam sentados nos puffs, folheando revistas e observando o movimento, cumprimentando um ou outro amigo que passava por lá. Se perguntava se ela quis dizer que o notava no geral ou se havia mesmo um interesse particular nele. Mal se dava conta de que a conversa continuava e ele lhe respondia poucas palavras, como se estivesse num transe.

De repente se viu abraçado com ela. A 'brincadeira' havia começado por sugestão de uma amiga dela, que junto com alguns outros por ali faziam uma rodinha. Ela falava com o rosto bem perto ao dele, que sentia o perfume dos cabelos e mal ligava para o que ela dizia.
Então as palavras foram ficando mais próximas. A boca dela mais perto do rosto dele. Na bochecha, depois no canto da boca. Logo ele se virou, colocou gentilmente a mão em suas costas... E estavam num beijo que, ao menos para ele, parou tudo ao redor e o fez sentir, de novo, naquela praia.

Ele acordou. Não era o garoto de dezessete anos. Mais precisamente, quase dez anos havia passado. Sabia que fôra um sonho, mas não era isso que o inquietava. Era parte sonho, parte lembrança, e suas lembranças volta e meia o perseguiam.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Desmemórias- capítulo ?

O apartamento tinha as luzes apagadas. Ele tentava não fazer barulho, mas lhe incomodava um pouco o fato de não poder se sentir a vontade. Tinha visita no quarto extra. Lhe parecia confuso quem estava lá, se um parente ou alguma outra pessoa. Os dias passavam confusos a ele.
Achando que nada que fizesse acordaria o [a] hóspede, abriu a cortina da sala. Olhou pro céu negro-azulado. Um imenso relógio digital no topo de um prédio ali perto marcava 04:00hs.
Ficou alguns segundos calado em seus pensamentos, avaliando aquelas luzes que jamais paravam de piscar. Ele mal dormira, e nem mesmo o fato de ter alguém no apartamento lhe impediu de dar uma das costumeiras voltas pela rua quando o sono não lhe encontrava.
A vontade na rua que já apresentava certo movimento [ou ainda apresentava movimento], ele andou alguns metros até a padaria da esquina.
24 horas. Ele lia o letreiro de neon, e tinha impressões retrô do que seria aquele lugar 30, 40 anos antes. Gostava de parar pra pensar em coisas tolas, que outras pessoas ignoram. Pediu, como sempre, a maior das xícaras com um forte café, acompanhado de conhaque. Se aquilo lhe dava disposição para o dia era um mínimo detalhe, o fazia porque gostava, talvez por vício, talvez por não ter nada mais a fazer num horário insólito como aquele.
Ao menos lhe ajudava a cobrar consciência, e ele começava a lembrar mais claramente do que vinha acontecendo. E se arrependeu, culpou o café, falou meia dúzia de palavrões pra si mesmo, ou então para os arruaceiros que passavam ali por perto, talvez.
- Conhaque vagabundo -murmurou, mas pediu uma dose a parte.

Sabia que uma dose de realidade, ainda que às quatro da manhã, é necessária para alguém que foge dela durante o dia.

E lembrou então de que dia era. Sexta-feira. Tinha um 'importante jantar' com a mãe da sua 'amiga'. Ele relutou o quanto pôde, mas como ela deixou escapar algo pra mãe sobre um rapaz com o qual estava saindo, não houve jeito.
Ela, separada de seu pai, já achou por ser um namoro sério, quis conhecer o tal rapaz, estava ansiosa pelo dia do tal jantar. Talvez desejasse com tamanha intensidade para a filha um relacionamento seguro que não se deu conta de que a própria filha não admitiu ser um relacionamento.
A noite cheirava a desastre, ele sabia disso, e seu dia já começava mal.
O café e o conhaque desciam queimando. Decidiu voltar, caso a visita acordasse, e já era mesmo hora de tentar algumas horas de sono.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Sobre estufa, carnaval e hipocrisia

[Já faz tempo que não critico algo...]


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Tenho no computador, bem separado como não pode deixar de ser para alguém metódico, matérias jornalísticas 'diversas'. Entre aspas porque a maioria delas é sobre um único tema: aquecimento global. Não sei porque ao certo, mesmo porque acho que não precisa de explicação.
Desde o nível de gelo na Groenlândia [que atualmente quase ninguém sabe onde fica] ao impacto da navegação nos oceanos, enfim, um material sempre crescente.
Talvez para alguém pouco observador os detalhes não sejam notados, mas está cada vez mais fácil: as tempestades de verão cada vez mais terríveis, as enchentes mais desastrosas, o granizo maior e mais pesado [e isso falando só de São Paulo, pois as conseqüências climáticas estão por todo lugar]. Nada disso acontecia até alguns anos atrás, ou até acontecia, mas não com tal fúria. É só ver a incidência de ciclones no sul do Brasil e a ressaca cada vez maior no sul e sudeste. E também o fato de várias baleias encalharem nas praias Brasileiras.
Tudo isso vem do aquecimento. Mas continuamos ignorando...
Quando uma tempestade cai, destrói barracos, inunda casas e causa inúmeras perdas, qual é nossa primeira reação? "Ahh, São Pedro exagerou!"
Estamos perdendo tempo demais com o plimplim e esquecendo do que realmente importa... Daqui cinqüenta anos não teremos mais um planeta 'harmônico' como é hoje. E infelizmente já temos que usar aspas.
Hoje no mundo globalizado das 'Nações Unidas' toda negociação é realizada a duras penas e com muita discussão, o que leva anos. É só ver o Protocolo de Kyoto e a Rodada de Doha. Quantos anos discutindo tratados que nascem com prazo de validade e quando entram em vigor já estão pela metade!
Se barganha tanto pela redução da redução de índices que tudo vira uma grande palhaçada. São os responsáveis pelas relações exteriores dos países que mais causam e mais sofrem com as conseqüências que estão reclamando uma revisão de meta aqui e ali, pois isso 'prejudica o crescimento do país'. São algumas dezenas de diplomatas enfadonhos com o fato de terem que estar ali que estão protelando mais e mais as curas para o planeta. Devem achar que há bastante tempo para salvá-lo [talvez eles sejam apenas 'grandes otimistas']!
Ou hipócritas, o que parece mais cabível. Como se fosse possível escolher 'salvar um pouco e consumir um pouco', em detrimento de encarar a realidade, diminuir emissões, quebrar barreiras protecionistas e perdoar dívidas de países miseráveis. E ainda são capazes de dizer que tudo isso é demagogia, impossível de se realizar.
Dei-me conta de que não só as cidades, os estados, o país está na mão de pessoas pouco preocupadas em mantê-lo, achando que será sempre renovável. Mas não, o mundo todo está, na realidade. Começo a descrer perigosamente na ONU, que foi idealizada pelos EUA, é verdade, mas sempre procurou ser correta. Estão todos emperrados sem saber como avançar um passo sem retroceder dois. E lá estão algumas das mentes mais inteligentes de cada país, o que torna mais incrível o atraso mundial em relação aos próprios recursos.
Apenas para quem está muito fora de órbita, preocupado com o Big Brother [não o de George Orwell] não liga para isso. E pior, esses são a maioria.
Aliás, sem saber dos números é certo falar que quase todo mundo que você perguntar nem faça idéia de quem é Orwell. E a tendência é só piorar, se quiser encarar a realidade.
Mas voltando para a hipocrisia. Sim, hoje é ela que governa a ONU, o Brasil, os estados e por aí vai. Aliás ela não é exclusiva dos três poderes. Em todos os setores da Economia e camadas da Sociedade ela está lá, enrustida nas palavras e ações de cada um, mas vem à tona facilmente numa simples conversa.
E claro, o Brasil também é o país do Carnaval. Mas está sendo dominado pela hipocrisia também. Cada vez mais difícil de notar as belezas de alegorias e adereços que só o Brasil é capaz de produzir, porque por trás disso há um negócio milionário. Sim, negócio e milionário, tendo em vista as cifras de patrocínio de escolas e valores de transmissão e intervalos comerciais. Alguma empresa investir em determinada escola nem é condenável, dependendo do caso, agora o perigo está se espalhando...
Uns anos atrás uma escola do Rio teve o patrocínio de ninguém menos que a estatal brasileira do petróleo, para mostrar na avenida um enredo sobre nada menos que... Energia!
O resultado desastroso na apuração talvez tenha sido um alento para nós que reparamos nessas faltas de senso.
Mas esse ano a coisa foi elevada a outro nível. A prefeitura [?!] de Recife doou alguns milhões para essa mesma escola falar sobre... Recife e o frevo!
Enquanto as próprias escolas de samba de Recife receberam algo próximo de 20 mil reais cada, menos ou mais.
Mas claro, o carnaval do Rio é visto pelo mundo todo, é justificável...
E outra escola, aliás, a atual campeã, e que tem faturado tudo nos últimos anos com ajudas no mínimo questionáveis de patrocínio venceu esse ano falando sobre outra cidade... A longínqua Macapá, que para quem é do eixo centro-sul é um grande mistério, assim como os outros estados do norte e até mesmo alguns do nordeste [já que para a imprensa daqui costuma considerar que o Brasil é aqui e apenas aqui].
E falaram de Macapá porque querem mostrá-la para o Brasil e/ou o mundo?
Alguns, até quero crer, talvez sim. Mas não quem idealiza o show. A hipocrisia está aí de novo, mostrar preocupação com pessoas que vivem dentro do nosso próprio país e que por falta de espaço não podem mostrar as belezas e costumes de sua terra. Na teoria é tudo muito singelo, mas francamente, vindo de onde vem não há como concluir outra coisa.
E esses mil e um pensamentos lhe passam pela cabeça quando você tenta se concentrar no que as escolas estão mostrando de bom na avenida, porque de fato ainda há muitas coisas boas, graças a Deus e aos carnavalescos humildes e sem mania de querer conquistar o mundo!
E uma pessoa que não consegue simplesmente organizar os pensamentos e tem comichões para colocar tudo no papel tem que se perguntar... "Eu sou crítico demais ou isso é muito descarado?". Não há como fechar os pensamentos afirmando que o Brasil é o país da hipocrisia institucionalizada.
Mas 'felizmente' [utilizada nessa frase com o sentido mais bizarro que já vi] não é privilégio nosso. A ONU está aí para não nos deixar esquecer.
Quem sabe se minha carreira de cineasta vingar eu ainda farei um filme sobre um planeta com recursos abundantes, avançado em tecnologia e em material humano e que sabe cuidar muito bem do que sua natureza lhe oferece resolve fazer expedições para tentar descobrir outros planetas com vida semelhante, 'inteligente', e aportem na Terra...
Bem, se é que o Kubrick ainda não fez isso. Mas é assunto pra outras estórias...

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Idéia

Não duvidar.
Agarrar-se às idéias como se fossem a própria musa.
Deixar o mundo se mover, insano
Perder-se pelas janelas
E encontrar as palavras na roleta.
Deixar que olhem estranho
E estranhar a falta de interesse de todos.
Decorar o ritmo que imprimem
E destoar do mesmo apenas por transgredir.

Anotar na memória não as palavras
Mas as impressões.
Usá-las como o pintor com a tela em branco.
Lembrar, sempre, o que se quer contar.

Querer construir o mártir
E se contentar com o fora do comum.
Querer construir a musa
Achar a perfeição em cada uma delas
E querer morrer por ela, se existir.

Juntar tudo na mente
Que registra milhares de informações.
Esperar então que saia algo disso
Registrar finalmente as idéias
E corrigí-las, pouco a pouco
Fazendo das idéias, arestas.
Aparando e criando
Destruindo e desistindo

E ao final
Não querer mudar uma vírgula.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Mais um ano...

Buenas, meus caros... Em primeiro lugar, um obrigado àqueles que não abandonaram esse blog mesmo quando eu abandonei minhas esperanças.
Como tudo se recicla e o mundo não pára, eu também não posso. Então a gente vai levando...
Quero que as 'auto-ajudas' se explodam porque é algo em que eu não acredito. Mas cada um deve acreditar no que lhe parece certo. Minhas metas pra esse ano são apenas uma continuação do ano passado, tirando a letargia que me abateu por muito tempo.
E como um ponto de honra daqui pra diante é não deixar nada sem terminar, encerro a série de posts Fade-out. Algo tolo, que surgiu por causa de alguns sonhos mal-explicativos e muita vontade de fazer de alguns pequenos poemas, Cinema. Ou pelo menos algo que pareça isso.

É só clicar aqui pra baixar o arquivo inteiro, o poema de introdução e os Takes, que nada mais são do que uma explicação de cada estrofe do poema.

Saudações e não um ano bom pra todos, mas dias bons para todos.

Fade-out

Take 6

O olhar vai longe, sem querer encontrar nada.
Não objetiva algo a se ver, apenas escaneia o que acontece
Olhando e desviando, fixando e perdendo o interesse
Tolamente gastando seu tempo.
Parece que enxergam a tudo, mas aquilo não serve de nada.
Escrevem histórias a serem contadas, com atenção a detalhes
Para logo depois perder novamente o olhar
Impotente.

Fade-out

Take 5

A linha do horizonte se apresenta
Difícil de separar onde começa e o que acaba.
A poeira de terra subindo, o cheiro da chuva
O vento que traz e que leva
O isqueiro que nada mais é que uma recordação inútil.
Recordações como filmes
Filmes sobre datas que passaram.
E quando passam, já não são nada mais que recordações.


domingo, 6 de janeiro de 2008

Como a saudade

É como ficar sem tocar o piano. Ele acumula poeira, você acumula desculpas.
A corda se rompe, as teclas desafinam, o pedal se solta, a banqueta fica dura.
Você se esquece de como poderia ser simples tocar uma mulher.
Seu piano fica insensível, os sons graves mais agudos e os agudos mais graves.
Seu tato parece um cactus e seus modos mais defensivos.
De Bolero você se torna um Tango.
Do suave ao seco, você se inspira no vinho, e espera que o tempo corrija tudo.
Esqueceste as curvas do piano bem como as de uma bela mulher.
Trocaste o som das teclas ecoando e também o sorriso retribuído.
Você se tornou um ser puro.
Puro como a saudade...