quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Desmemórias- capítulo antepenúltimo

Ele voltou da praia, e para sua surpresa, ela mesma foi quem tomou a iniciativa de procurá-lo. E terminarem por ali. Ela deu a desculpa de que a faculdade estava difícil e teria que se concentrar nos estudos, e ele não se esforçou para pensar se seria verdade ou não. Respirariam ambos.
E nos dias e semanas seguintes foram, lentamente, buscando coisas um do outro em seus apartamentos. E para ambos, a impressão de que quando algo assim acaba tudo se torna insignificante a ponto de trazer lembranças tolas. E são essas as que mais machucam por sua falta.
Mais alguns dias, semanas, meses se passam. Ele sentia um vazio que o tornava um robô. Ela, pelo que ele soube de algum amigo em comum, estava namorando. Ficou contente. Ainda achava que era o que ela merecia, se julgava jamais poder se confiar a alguém de novo. Mas quando esses pensamentos solitários batiam, lembrava do dia no cemitério, e do céu cinza, e pensava consigo mesmo que precisaria, de qualquer jeito, encontrar algo que lhe fizesse sorrir. Não sorrir o tempo todo como a fase juvenil lhe proporcionava, mas algo que lhe desse prazer além do período em que estava com a câmera na mão, captando não só momentos, como sentimentos do que via. Precisava se sentir vivo, e foi se aventurar a clicar esportes radicais. Nesse meio tempo continuava os trabalhos casuais, e foi na cobertura de uma festa [o que ele mais detestava] que encontrou alguns amigos da época do cursinho.
Houve alguns abraços. Perguntas de um lado e de outro, quando a resposta “Na verdade to trabalhando aqui hoje” surpreendeu a todos. Não poderiam reeditar as conversas e baladas de anos atrás. Mas trocaram telefones. Nem ao menos chegaram a perguntar a ele sobre a antiga namorada. E nem poderiam, não caberia para o momento, um ano e pouco depois.
Fato é que ele, procurando ser o oposto do que vinha sendo, ligou para o amigo, num sábado pela manhã. Acordou-o e se desculpou, ouvindo do outro como fora a noite anterior, e como ele fez falta no recinto. “Eu fiz falta? Explica isso!”, perguntou, quando ouviu do outro a resposta: a amiga da sua acompanhante estava sozinha, havia levado um fora do ficante e só soube disso ao notar que ele não iria aparecer... E quem salvou a noite foi o amigo de cursinho, falando dele, um fotógrafo, cara simpático, meio fechadão, mas boa pinta. A garota, ainda num leve desânimo, concordou... Se o próprio não achasse aquilo patético demais...

Desmemórias- capítulo 06

Apenas algumas horas após retornar da praia ele não queria ficar só, muito menos no apartamento vazio. Apenas deixou a mochila, e devolveu o carro.
Da casa do amigo andou uns vinte minutos a pé. A princípio sem rumo definido, mas seus passos o levavam automaticamente até lá. O cinema no centro, onde tantas vezes eles foram juntos, as vezes matando aulas do cursinho.
Olhou o movimento e finalmente se decidiu a apenas sentar-se numa mesinha do café. Pediu um. Ali não haviam bebidas pra batizá-lo. Conformou-se com o café quase amargo. Ela gostava doce. Ele queria parar de pensar, mas, se o fizesse, não seria desrespeito?..
Ficou ali um bom tempo. Passadas umas dezenas de minutos até conseguia esboçar um sorriso, com o sol do inverno lhe fazendo tirar o cachecol, que ela ensinou-o a gostar. Mais alguns minutos e ouvia os comentários cruzados das pessoas que saíam de uma sessão recém-terminada. Alguns falavam em “destino”, outros em como o filme foi previsível, algumas jovens se encantavam com a história. Nada que ele não conhecesse, já havia passado por todos esses tipos de comentários quando saíam juntos de lá.
E lembrou, ainda que se esforçando para ser a última que dedicaria a ela pelo menos naquele momento, de uma das últimas conversas antes da separação forçada por causa da faculdade:

- Você vai... Diz que vamos nos ver, nos falar, mas chegando lá é outro mundo!
- Há quantos anos estamos juntos? –perguntou ela-
- Você sabe bem!
- Então você não acha que isso é o bastante pra confiarmos um no outro?
- A gente diz isso agora. Facul é só balada, é gente nova, e a gente ta brigando há uma semana por causa disso. Não dá, não dá pra ser assim desculpa!


Ele sentenciou o fim. Ele não deixou resposta para ela. Ele mesmo imaginou a vida de ambos juntos de mil maneiras diferentes... E não chegou a dizer isso. Deixou acabar, consumido pela amargura. E agora, era só arrependimento. Por mais que quisesse buscar coisas ruins dela para lembrar, não conseguia: apenas lembrava de seus erros. E assim levou os próximos meses...