sexta-feira, 14 de setembro de 2007

A madrugada é meu elemento

Hora de silêncio. Enqüanto [quase] todos descansam, só o ruído do computador ligado e das teclas batidas com afinco e calma, ao mesmo tempo.
Na rua o silêncio. A lua se o céu é claro, e se está nublado, não é de todo mal. Nos prédios quase nenhuma luz acesa, e as que persistem certamente pertencem a outros notívagos. Pessoas à parte do normal, transformam a noite em dia e dela aproveitam o máximo, ao custo de algumas horas de sono.
Um mundo paralelo que apenas se desenvolve enquanto a penumbra cobre as ruas. Os que em casa trabalham ou se divertem, os que do lado de fora preferem andar a pé, de preferência acompanhados de boas conversas e bebidas. Apenas o barulho profano de alguns carros e ônibus que insistem em dizer que a madrugada também tem vida.
A vida... Incrivelmente efervescente, abafada pelos clubes fechados de música absurdamente alta ou barzinhos de música ao vivo com pessoas que vivem da e para a madrugada;
Ou então reprimida pelos apelos dos que tentam dormir e se incomodam com o som dos passos e risadas daqueles que passeam pelas ruas. Aqueles que amam ainda mais a madrugada por ser transgressora, comportamental e moralmente horário de dormir, apenas.
Ser dela um amante não é tarefa fácil, e é recomendável aprender desde cedo, o que reforça seu caráter 'transgressor', pois jovens andando pela madrugada, numa mistura comumente de drogas e álcool geralmente não resulta em boas conseqüências. Mas há os que, felizmente, não se deixam levar pelo seu breu acobertante. Aprendem a aproveitá-la, horas escassas que fazem falta no dia seguinte.
É a hora de libertação. Os escravos do horário comercial podem relaxar, beber alguma coisa [a quantidade ou o teor alcóolico depende de cada um], falar palavrões com amigos [não em caráter desrespeitoso, apenas extravasando], andar sem rumo definido, mas principalmente, conversar: é quando cada um pode falar o que quiser, assunto importante ou não, sem se sentir vigiado, avaliado, julgado.
Os que vivem da/para a noite geralmente já estão acostumados com tais acontecimentos, sabem o que esperar de uma noitada e principalmente sabem do que falar. É como uma sociedade, com todas as suas camadas, inteligente e próspera. Os que têm o discernimento de avaliar detalhe por detalhe dos assuntos mais difíceis ou aqueles que não tem tal cultura, mas entendem na pele tudo o que se discute. É uma população aberta ao diálogo, algo que se perde nas horas loucas do dia ensolarado, quando todos querem e são obrigados a se comunicar rápido, a trabalhar rápido, a ser sempre mais rápido que o colega ao lado, depreciando assim as relações pessoais. Os escravos do horário comercial não se conhecem, e a madrugada, ao contrário, proporciona exatamente isso.
Resta aos amantes da madrugada uma vida paralela à normal. Por causa das horas perdidas de sono, geralmente são amantes do café e das bebidas estimulantes, além do álcool. São comumente associados a pessoas que vivem fora da lei [pelo menos a lei que consta no papel], estão acostumados a batidas policiais e chamados de 'apelidos' nada animadores, as vezes visto como vagabundos que nada melhor têm a fazer. Muito pelo contrário, olhando de perto, nesse horário encontraremos algumas das pessoas e idéias mais facinantes, um mundo [pelo menos imaginário] mais próspero e possível de funcionar do que o iluminado pelo sol e regido pelo dinheiro.
Ahh sim, o dinheiro. Necessário dia e noite, como não poderia deixar de ser. Bancos 24 horas que não funcionam depois da meia noite, luminosos alucinantes piscando pela cidade, convidando os passantes noite adentro [felizmente não há mais luminosos e propaganda na cidade de São Paulo]. Necessário, sim, mas não fundamental. Com qualquer 5 ou 10 reais, juntando moedas entre amigos e guardando apenas o necessário para voltar pra casa, pode-se divertir e encontrar por aí inspiração para conter os bocejos até o dia amanhecer, seja qual for o gosto de cada um.
O único pesar dessa vida é que a outra vida, a que costumam chamar de 'importante', é opressora e não vê com bons olhos aqueles que apreciam a noite. Uma pena, pois essa vitalidade e essas idéias que surgem na madrugada, único horário livre que os escravos podem se dedicar ao que realmente lhes interessa, que movem a sociedade-diurna-capitalista-selvagem;
Tudo o que estes notívagos gostariam, e este singelo narrador endossa, é uma sociedade que não ficasse presa ao relógio e ao céu, escuro ou claro, e sim vivesse desse céu. Parasse por alguns minutos para pensar que nós vivemos do mundo, e não o mundo vive de nós. Nós passaremos, mas o que vamos deixar?..

T. 14/09/2007

3 comentários:

Unknown disse...

Faltou somente as bikes para vc ter descrito exatamente várias madrugadas de Thiago, Grenissa, Edson e Marcus! Vou passar pra eles esse texto! beijão

disse...

Amo a madrugada.
é uma tórrida paixão.

Unknown disse...

Po, eu tb era assim.. ai ai velhos tempos...
Adorei o texto!!

:*****